São Paulo, terça-feira, 14 de outubro de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Erros comprometem noite blueseira em SP

EDSON FRANCO
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma série de erros táticos comprometeu a noite de blues do Free Jazz Festival no Palace. O maior deles foi o horário. Iniciada às 21h30 do domingo, a festa blueseira terminou às 2h da segunda.
Cansada, a platéia recusou os convites à dança que vinham do palco. Com um clima pós-musiquinha do "Fantástico" estampada na face, o público dividia suas atenções entre os solos e a estratégia que teria de bolar para saltar da cama dali a poucas horas.
Contra esse estado de coisas, Ronnie Earl, Otis Rush e, especialmente, Jimmie Vaughan deram tudo no palco, mas também cometeram ou foram prejudicados por erros táticos.
Quem chegou atrasado ao show de Earl, que abriu a noite, deve ter pensado que entrara no lugar errado e estava conferindo a apresentação de uma banda cover do guitarrista mexicano Carlos Santana.
Trajando uma camisa tipo bata e um gorrinho afro, Earl passeou por diversos estilos -alguns deles latinos, daí a associação- antes de chegar ao primeiro blues, já na quarta música.
Seu fraseado, outrora cheio de suingue, está mais linear e com notas sustentadas por longo tempo, receita patenteada por Santana.
Com apenas uma hora para mostrar do que era capaz, ele foi infeliz na escolha do repertório. O show terminou quando estava decolando, com "Thank You Mr. T-Bone", em que homenageia o pai da guitarra blueseira orquestral.
No fim das contas, quem acabou brilhando foi o tecladista Anthony Richard Geraci. Versátil, ele encarno McCoy Tyner (o pianista do quarteto de John Coltrane), em "Alabama", e, nos seus solos, mostrou qual seria o resultado do cruzamento genético entre a finesse de Pnetop Perkins com a fúria de Jerry Lee Lewis.
Responsável pela tradição da noite, a atração seguinte, Otis Rush, seguiu a cartilha do ritual blueseiro.
Primeiro, a banda (competente, apesar dos excessos do baterista Ray Stewart, que não deixava os pratos em paz) tocou duas músicas. Com palmas efusivas, Rush subiu ao palco às 23h, plugou sua guitarra e atacou frases inesquecíveis e comedidas em "Shuffle in 'A'".
Tímido no começo, Rush tocou olhando para o braço da guitarra as primeiras três músicas. Mais confiante, passou a esticar demais as canções, em especial "Homework" e "I Got My Mojo Working".
Nessa última, o guitarrista convidou a platéia para cantar o refrão e foi atendido. Mas o entusiasmo do público ia diminuindo na medida em que o refrão era repetido por exaustivas 12 vezes.
Quem errou menos foi Jimmie Vaughan. Com uma banda afiadíssima, destaque para os vocalistas de fundo Dennis Lay King e Leroy Calbert Burns, Vaughan destilou pérolas blueseiras de quatro minutos e jogou para a torcida. Pena que o jogo já estava na prorrogação.
Tocou os maiores sucessos de sua carreira solo, lembrou o irmão famoso (Stevie Ray Vaughan) numa versão de "Texas Flood", desculpou-se -em nome das gravadoras- pelo fato de seus discos não terem saído aqui e fez um show para cima.
Mas pagou o pato pelo erro estratégico da organização. Quando deixou o palco pela primeira vez, à 1h40, a platéia estava indecisa se pedia o bis ou se corria para o estacionamento, pelo qual pagara os escorchantes R$ 15 de praxe.

Texto Anterior: Quatro dias, 22 shows, nove imagens
Próximo Texto: Saxofonista fecha evento com show sem concessões
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.