São Paulo, quarta-feira, 15 de outubro de 1997
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'Nó na Garganta' é horror cômico, diz Jordan

CECÍLIA SAYAD
DA REDAÇÃO

Se precisasse classificar sua adaptação para as telas do livro de Patrick McCabe, como que Neil Jordan definiria "Nó na Garganta"?
"Horror cômico" foi a resposta que o diretor irlandês ("Traídos pelo Desejo") deu à Folha, em entrevista concedida por telefone do set de filmagens de sua nova produção, "In Dreams", na Nova Inglaterra (EUA).
O horror, no livro e no filme, fica por conta dos fatos narrados (leia texto abaixo). O humor está presente na maneira como o protagonista Francie Brady vê o mundo ou como o mundo é mostrado ao espectador, uma vez que o filme, assim como o livro, adota o ponto de vista do personagem.
Jordan disse que um dos maiores desafios, ao adaptar o romance, foi reproduzir o fluxo de consciência presente no livro para o cinema.
"É algo muito difícil de se fazer", afirmou. "Mas filmes são como sonhos, e acho que essa é uma razão pela qual a história foi muito bem transposta, pela possibilidade que o cinema tem de misturar o sonho à realidade."
Sendo assim, o cinema seria realmente o melhor meio para reproduzir a mente perturbada de Francie, cuja insanidade vai se revelando cada vez maior, a cada linha do livro e a cada sequência do filme.
Jordan se utiliza de uma narração em off feita pelo personagem (que, quando criança, é interpretado por Eamonn Owens e, adulto, por Stephen Rea, que também faz o pai de Francie), o que dá, segundo o diretor, certa comicidade à história.
Mas, se por trás do humor se esconde uma forma de crítica, Neil Jordan evita emitir juízos de valor sobre o comportamento estranho do protagonista de seu longa.
"Eu queria apresentar o retrato de um garoto ficando louco, basicamente, e os acontecimentos que o levam à loucura. Mas não fazer julgamentos", diz.
"Quis mostrar Francie como uma simples criança. Ainda que essa criança faça coisas terríveis."
Mas como reproduzir uma mente perturbada? Tentando se colocar na pele do personagem?
"Sim, um pouco", responde o diretor. "O livro de McCabe é muito envolvente. A voz desse menino entra na sua cabeça e é difícil livrar-se dela."
Neil Jordan não nega que o estranho Francie Brady acaba resultando num personagem simpático. "No entanto o público não tem que aceitar seus crimes", afirma o diretor. "Francie é um menino perturbado pelos acontecimentos de sua vida."
Mas fatores externos podem ser a razão da loucura de uma pessoa?
"Não, acho que não. Essa questão é muito difícil. Só sei que Francie Brady tem uma grande imaginação, um belo coração e uma bela alma. Ele não tem defesas com relação ao que lhe acontece."
O fato de o personagem viver em uma cidade pequena interfere em sua loucura, segundo Jordan.
"O interior da Irlanda é uma região muito estranha, dominada pela superstição e pela repressão. Uma repressão psicológica. A Igreja Católica é muito influente. O lugar é um modelo de insanidade para mim", explica.

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