São Paulo, sexta-feira, 17 de outubro de 1997
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Falabella mergulha em comédia triste

NELSON DE SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

Diz César: Você sabe que eu não entendo essas histórias de enredos complicados. Sou homem de trama fácil, minha vida daria no máximo um cordel.
Emenda Rita: Mudam os autores, mas as histórias continuam as mesmas...
As velhas histórias de amor -é o que o perdido casal de "Submarino" está a dizer.
Miguel Falabella e Maria Carmem Barbosa, os autores da comédia romântica, não tinham outra ambição. Queriam voltar à mesma trama, ao mesmo enredo simples dos conflitos de namorados, de um casal que se ama e não se suporta, em momentos alternados. Que se separa, que volta, continuamente.
É uma comédia triste. Apesar da experiência e da qualidade provada dos dois comediantes que a interpretam, o próprio Falabella e Zezé Polessa, a peça não é para fazer ninguém se debater na cadeira do teatro, em risos.
É certamente engraçada, mas ao mesmo tempo traz dois personagens perdidos, solitários na cidade, levando a vida mais com compaixão um pelo outro do que por alguma paixão dominadora, superior a eles mesmos.
Não que não estejam presentes as fórmulas conhecidas, algumas muito questionáveis, do humor de Miguel Falabella. Os intérpretes riem um do outro, por vezes; distribuem palavrões pelo palco; brincam com coisas do cotidiano, como as facas Ginzu etc.
Mas César, no caminho, perde o emprego e enfrenta o choque. E se retrai, solitário. Rita acredita-se grávida duas vezes, uma dele, esperança falsa, e outra de um amante, e aborta. Ambos falam do silêncio que fazem os seus próprios cabelos "embranquecendo".
E atiram as frases feitas, as "one-liners" que caracterizam tanto os textos de Falabella e Maria Carmem Barbosa. Desta vez, porém, subliminarmente tristes, abatidas, até niilistas.
Por exemplo, ao estabelecer que "intimidade é um risco que a gente só devia correr com quem não se tem a menor intimidade". Ou "o importante não é acertar, é errar erros diferentes" -um juízo nada otimista da existência.
E é mais das individualidades sufocantes de um homem e de uma mulher que "Submarino" trata, e não de um casal. O Miguel Falabella comediógrafo, a bem da verdade, jamais caiu inteiramente na comédia, restando sempre um gosto amargo das suas peças, inclusive as que se identificam mais adequadamente com o besteirol.
E "Submarino" aproxima-se assim de um drama, com todos as insuficiências do gênero, frente à comédia e à tragédia. A maior delas sendo um tamanho efeito desmobilizante, conformador.
"Submarino" paga ainda, é claro, o preço de ser uma peça conformada à trama fácil, à mesma história de sempre.
Mas está lá o comediante Falabella em momentos por vezes únicos, com um talento de humor e de diálogo com a platéia que nem o dispêndio extraordinário em projetos e apresentações e gravações, principalmente na televisão, parece capaz de desgastar.
Também Zezé Polessa, atriz menos conhecida do público de São Paulo, mas que é, em turnos, histericamente cômica e intensamente contida, compenetrada, o que é característica bem própria dos grandes comediantes.
Os personagens de ambos, se não chegam a se desenhar inteiramente, por exemplo, na oposição ela intelectual/ele iletrado buscada pelo texto, são de firme construção em outras direções, mais difusas, como a da solidão.
Quanto à cenografia, Gringo Cardia volta a alcançar efeitos claros com elementos mínimos, no caso, a cama que se parte em duas e, sobretudo, a imensa "parede" de eletrodomésticos que cerca e encerra o casal.

Peça: Submarino
Quando: qui, às 21h30; sex, às 22h; sáb, às 20h e 22h; dom, às 19h
Onde: Teatro Procópio Ferreira (r. Augusta, 2.823, tel. 011/883-4475)
Quanto: R$ 25

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