São Paulo, sábado, 18 de outubro de 1997
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Longa mostra o 'espírito nordestino'

PEDRO CIRNE DE ALBUQUERQUE
ENVIADO ESPECIAL A TERESINA (PI)

No momento em que filmes paulistas e cariocas aparecem com boa frequência nas telas brasileiras, o cinema piauiense vive a produção de seu primeiro longa-metragem dos últimos anos: "Cipriano", de Douglas Machado.
Rodado exclusivamente no Piauí -segundo seus produtores, é o primeiro longa do Estado-, com locações em Piracuruca, Piripiri e no interior do sertão, o filme foi escrito e dirigido por Machado.
O diretor define o período de filmagem de "Cipriano", que durou de 24 de agosto a 13 de setembro de 97, como o fruto de uma "comunhão estadual".
"'Cipriano' é uma cooperativa. A maioria das pessoas não quis ganhar cachê. Toda a comunidade se envolveu com o filme e deu ajuda para que ele pudesse acontecer."
Entre a ajuda que recebeu de piauienses, Suzane Jales, a diretora de produção do filme, cita a farmácia que doou remédios, a fábrica que parou a produção para dar velas e os amigos pessoais que lhe cederam, para citar um exemplo, uma casa e um caminhão para as filmagens.
"O interessante de a comunidade ter se envolvido é que ela cobra muito de nós: ligam-me de várias cidades e pedem que o nosso filme seja exibido já", conta Jales.
Para Machado, esse envolvimento do povo com o filme resulta do poder da mídia sobre as pessoas. "A possibilidade de você ver na tela de cinema a rua em que você anda ou um lugar que você conhece atrai tanto o bancário ou o jornalista paulista como aquela pessoa humilde do interior do Brasil", diz.
Morte e sonho
O filme focaliza um senhor, Cipriano, que está prestes a morrer. Para o enterro, seus filhos procuram um cemitério em frente ao mar, atendendo aos sonhos do velho homem.
"'Cipriano' gira em torno de morte e sonho. Ele trabalha com o imaginário popular. O filme não é um cartão-postal do Piauí, é muito mais sobre o espírito do sertão nordestino", diz Machado, que refuta a idéia de bairrismo.
"Nós não queremos levantar a bandeira do bairrismo, ou defender que a cultura piauiense é a melhor do país. Eu queria um olhar sem preconceito, uma visão apaixonada do sertão."
Filmando a cultura popular, Machado conta ter se inspirado, principalmente, no trabalho das velhas rezadeiras -pessoas, geralmente mulheres, que oram para expurgar o culpa das pessoas- que participam do filme.
"As rezadeiras do filme interpretaram elas mesmas, fazendo as 'orações ao pé do morto', como são chamadas as orações que são feitas quando uma pessoa está morrendo ou em velórios. Eu fiquei muito impressionado com o rosto e a pele delas, que sempre me lembravam o chão por onde eu andava durante as filmagens."

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