São Paulo, segunda-feira, 20 de outubro de 1997
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A verdade está no vídeo

LÚCIO RIBEIRO
EDITOR-ASSISTENTE DA ILUSTRADA

Se o escritor americano Edgar Allan Poe ressuscitasse do mundo dos mortos, na certa sua primeira medida seria se associar à locadora mais próxima do cemitério presbiteriano em Baltimore, EUA, onde foi enterrado em outubro de 1849.
O cultuado autor americano de literatura policial/fantástica iria ressurgir das trevas tão familiar a seus contos movido pelo lançamento em vídeo de mais uma história da série de TV "Arquivo X".
"O Mistério de Piper Maru" é a sétima fita a chegar às locadoras do seriado mais visto no mundo inteiro (veja texto sobre este e sobre os seis outros nesta página).
Neste século, pouca coisa chegou tão próximo da estrutura narrativa de Poe do que a saga dos agentes Fox Mulder (David Duchovny) e Dana Scully (Gillian Anderson), que a cada sexta-feira à noite nos canais Fox e Record se metem a investigar casos estranhos, sobrenaturais e inexplicáveis.
Por meio da elaboração de sua trama, "Arquivo X" ("The X-Files") consegue com extrema habilidade fazer a construção precisa do impreciso, a impressão do real surgir a partir do irreal, o que na literatura é chamado de "poiesis".
O medo do desconhecido, daquilo que o homem não consegue explicar, é o fio condutor tanto da série quanto da escrita de Poe.
A verdade em "Arquivo X" está "lá fora". Fora do alcance. E sempre escapa. No seriado, ela vem metaforizada em ETs, em seres deformados, em seres com caráter deformado, em espíritos. Tal qual a base de toda a prosa de Poe, que também se apóia no fantástico das exacerbações e das inquietações da natureza humana.
As personagens de Poe caminham no limite entre realidade e ficção, artimanha da criação do autor para que o leitor não sinta dificuldade em penetrar na história, por achar que ela seja invenção, impossível de acontecer.
Para isso, as personagens do escritor estão sempre alteradas pela febre, pela bebida, em crise nervosa, para que o leitor pense: "Será que aconteceu mesmo?"
Já em "Arquivo X" esse limite entre a realidade e a ficção as transformam em personagens do seriado: o senhor Ficção (Mulder) e a senhora Realidade (Scully).
Para explicar os "devaneios" de Mulder (ficção), o leitor se vê representado na série por Scully (realidade), que não por acaso é a responsável pela narração dos casos. E, principalmente, responsável por interrogar Mulder a todo momento, fazendo as perguntas que os telespectadores, pés-no- chão, gostariam de fazer.
Alguns episódios melhor que os outros, "Arquivo X" é retumbante sucesso em qualquer lugar do planeta em que a série é exibida, de Varginha aos EUA, onde uma pesquisa apontou que 5 milhões de americanos acreditam já terem sido abduzidos por extraterrestres.
Veja a série, leia Poe e se entenda com seus medos. Você não está sozinho.

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