São Paulo, sexta-feira, 24 de outubro de 1997
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Menem perde sua invencibilidade

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A BUENOS AIRES

A frase soa como mero otimismo, obrigatório em líderes políticos no período eleitoral.
"Vamos quebrar a invencibilidade do presidente (Carlos) Menem", diz Carlos "Chacho" Alvarez, um dos presidenciáveis da Aliança, a coalizão oposicionista.
A frase erra apenas no tempo verbal: na prática, a invencibilidade de Menem já foi rompida.
Pode até ser que o placar eleitoral não reflita com clareza esse fato. Afinal, eleições legislativas como a de domingo na Argentina (renova-se pouco menos de metade da Câmara de Deputados) permitem leituras diferentes.
Exemplo, na boca do analista político Rosendo Fraga: "Se a Aliança ganhar na Província de Buenos Aires, seu triunfo será categórico no nível nacional. Se, em contrapartida, ganhar o peronismo nessa Província, ainda que seja superado nacionalmente, ficará uma certa sensação de equilíbrio de forças".
Mas, politicamente, a invencibilidade de Menem já se quebrou. Até agosto, quando se criou a Aliança, a sensação generalizada era a de que o presidente e seu partido (o PJ, Partido Justicialista ou peronista) eram imbatíveis.
Menem, pessoalmente, jamais perdeu uma eleição, antes e depois de se tornar presidente, em 1989. E o PJ venceu todos os pleitos legislativos dos últimos dez anos.
Agora, no entanto, há um forte consenso de que a hegemonia Menem/PJ acabou. Diz, por exemplo, a socióloga Graciela Rõmer, chefe de um instituto de pesquisas: "Já não estamos ante um sistema de partido dominante".
A eventual quebra da invencibilidade de Menem significa, paradoxalmente, a vitória do modelo que ele implementou no país.
A Aliança não questiona os três eixos básicos do modelo, a saber:
1 - A paridade fixa entre o peso e o dólar (1 dólar vale 1 peso desde abril de 1991).
2 - As privatizações.
3 - A abertura da economia, ainda que, neste ponto, a Aliança tenha ressalvas quanto ao grau.
Menem bem que tentou trazer o eixo da campanha para uma comparação entre o passado de hiperinflação e o presente (inflação de 0,6% nos últimos 12 meses).
A tentativa não colou. "A Aliança está rompendo o mito de que a estabilidade econômica está ligada ao menemismo", diz Ernesto Laclau, filósofo político argentino que leciona na Universidade de Essex, no Reino Unido.
Pesquisa publicada ontem pelo matutino "El Cronista" dá razão a Laclau: consultados 75 diretores das empresas que faturam mais de US$ 34 milhões, 60% disseram que a Aliança não vai afetar seus investimentos. Outros 7% disseram que vai afetar, mas favoravelmente.
Se, no essencial, as diferenças entre o menemismo e a Aliança parecem pequenas, por que, então, os argentinos podem preferir a cópia em vez do original?
Porque a Aliança parece estar tendo sucesso em introduzir uma nova agenda, pós-estabilização da economia. Uma agenda que inclui, como é óbvio, atenuar o elevado custo social do modelo.
"Trata-se de combinar a sustentabilidade econômica com a sustentabilidade social", diz, por exemplo, Juan Manuel Casella, um dos caciques da União Cívica Radical, que forma a Aliança junto com a Frente País Solidário.
Mas inclui também temas como o combate à corrupção e uma eficiente aplicação da Justiça.
A imagem de Menem nesses três pontos sempre foi débil. O presidente compensava esse déficit com a manutenção de uma inflação baixa. Agora, parece não estar sendo suficiente para lhe assegurar a invencibilidade.

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