São Paulo, sexta-feira, 24 de outubro de 1997
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Bairro tradicional ameaça estrangeiros

IGOR GIELOW
DO ENVIADO ESPECIAL A ARGEL

O Casbah, bairro mais antigo e sede do comércio popular de Argel, virou uma terra de ninguém para os não-argelinos.
Para entrar no território, que compreende um complexo de dez quarteirões de largura cortado por um imensurável corredor de vielas, ruas e ladeiras labirínticas, é preciso uma "tropa de choque".
No caso da Folha, que foi ao Casbah, em Argel, acompanhada de outros três jornalistas, o governo condicionou a visita, no fim da tarde de ontem, à presença de 11 policiais armados. Prática comum, aliás, a todos os jornalistas credenciados para a cobertura das eleições locais. Ninguém sai do hotel El Aurassi desacompanhado e sem dizer para onde vai.
Nas vielas sujas do Casbah, gatos dividem o espaço com idosos nas calçadas. "A vida está normal, a não ser por vocês, que vêm aqui falar mal de nós", grita em francês o dono de uma padaria.
A visita é tensa e demorada (quase uma hora). O bairro é escuro. A falta de luz se deve ao tempo chuvoso e à ocupação tipicamente árabe do Casbah -vielas estreitas com casas de até cinco andares.
Um grupo de homens tomando chá protesta contra as fotos, no momento mais complicado do passeio. Um dos policiais chega a sacar sua pistola 9 mm, mas tudo acaba sem violência. Eles temem algum ataque contra os estrangeiros, uma vez que o Casbah é reduto histórico dos fundamentalistas islâmicos na capital.
Logo depois, um símbolo brasileiro relaxa os ânimos. Um jogo de futebol com meninos de no máximo 12 anos se desenrola num pequeno platô entre duas casas na ladeira Khan-Beb.
O gol é desenhado com giz contra as paredes. "Guerra? Que guerra?", diz um dos meninos. Segundo os policiais que acompanham a visita, nada mudou na vida dos argelinos do Casbah. É tudo uma questão de segurança para a "mídia estrangeira", afirmam.
Toque de recolher
Mas as coisas mudaram para os moradores do resto de Argel, que somam quase 3 milhões. Existe um toque de recolher que, embora não declarado, tira quase todos da rua por volta das 21h30.
Anteontem à noite, a reportagem percorreu as principais ruas da capital argelina. A bela arquitetura colonial francesa é ressaltada pela iluminação noturna.
Mas a cidade pára. Poucos são os restaurantes que se dispõem a abrir até mais tarde. Nem os prédios governamentais apresentam a mesma segurança que têm durante o dia. Um dos maiores movimentos (de carros de polícia) ocorre nas cercanias da avenida Cheman Cheik-Bashir el-Ibrahimi, onde ficam a Embaixada dos EUA e a residência do embaixador francês.

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