São Paulo, sábado, 25 de outubro de 1997
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Médico quer melhor relação com paciente

AURELIANO BIANCARELLI
DA REPORTAGEM LOCAL

As escolas médicas precisam ensinar o aluno a ouvir o paciente. Mesmo dispondo da mais alta tecnologia, a medicina continuará dependendo do ouvido e do toque do médico.
Na maioria dos consultórios, acontece o contrário: conversar e apalpar o doente foram substituídos por baterias de exames.
O resultado é uma distorção e um desperdício que desgastam o profissional, desagradam ao doente e podem levar à falência o sistema público e privado de saúde.
O alerta foi feito no 4º Congresso Brasileiro de Clínica Médica, que aconteceu nesta semana em São Paulo. Os tons sombrios desse cenário já vinham sendo pintados há uma década no país. A diferença, agora, é que as tintas estão mais carregadas.
"Ou o país adota uma medicina viável com urgência, ou pacientes, médicos e instituições caminharão juntos para a falência dos serviços de saúde", diz Antonio Carlos Lopes, professor titular de medicina de urgência da Escola Paulista de Medicina, presidente do congresso e da Sociedade Brasileira de Clínica Médica.
A medicina viável, no seu entender, é aquela voltada para a comunidade, que não exclui doenças nem doentes, que não divide o paciente em pedaços e que dá ao médico tempo para ouvir o doente.
No "dia do médico", comemorado no último sábado, a pregação parece ser uma só: a necessidade de se recuperar a relação médico-paciente, aviltada hoje pelos honorários oferecidos pelo SUS e pelas empresas de medicina de grupo. Recebendo um máximo de R$ 20,00 por consulta, o médico dedica 15 minutos ao paciente e pede uma lista de exames que na maioria darão negativos.
A última edição do jornal do Conselho Regional de Medicina (SP) é quase todo dedicado à importância da relação médico-paciente. "A única maneira de a classe médica dar a volta por cima é valorizar cada vez mais o ato que caracteriza a profissão: a consulta médica", diz Pedro Paulo Roque Monteleone, presidente do CRM.
A relação de confiança entre médico e paciente depende também da formação do profissional, lembra Irineu Velasco, diretor clínico do Hospital das Clínicas e professor do departamento de clínica médica da área de emergências da Faculdade de Medicina da USP.
"O profissional bem preparado pode resolver até 80% das doenças ouvindo a história do paciente e realizando um exame físico". Os cerca de mil exames diferentes disponíveis hoje seriam necessários em apenas parte dos casos.
Velasco cita um estudo realizado por Wilhelm Kirck e Christine Schafii, publicado no ano passado nos EUA, que comprovaria esta tese. Os pesquisadores analisaram 400 atestados de óbito de pacientes mortos num hospital alemão nos anos de 59, 69, 79 e 89.
O estudo concluiu que, independentemente dos meios diagnósticos disponíveis, 60% a 70% dos casos foram diagnosticados pela história do paciente e o exame clínico. Apesar da sofisticação dos exames ocorrida naqueles 40 anos, a precisão do diagnóstico não aumentou.
Luiz Karpovas, secretário-geral da Associação Médica Brasileira, diz que generalistas e especialistas são necessários porque os conhecimentos se ampliaram tanto que fica impossível a um médico conhecer bem todas as áreas.
A Secretaria de Estado da Saúde, de São Paulo não está conseguindo preencher suas vagas para clínicos gerais, anestesistas, oncologistas, cirurgia geral e emergências.
Médico residente
Desde o início do ano, os médicos residentes da Faculdade de Medicina da USP estão fazendo dois anos obrigatórios de clínica médica, independentemente da especialidade que queiram seguir.
Segundo Velasco, essa prática resultará em especialistas com melhor formação em clínica geral.

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