São Paulo, domingo, 26 de outubro de 1997
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Caso 'Debate' coloca indenizações em xeque

ROGÉRIO SIMÕES
ENVIADO ESPECIAL A SANTA CRUZ DO RIO PARDO

A condenação do jornal "Debate", de Santa Cruz do Rio Pardo (375 km a oeste de São Paulo), e de seu editor e proprietário, Sérgio Fleury Moraes, 37, acirrou a discussão em torno das consequências das ações indenizatórias ao trabalho da imprensa.
Em agosto deste ano, o juiz Osny Bueno de Camargo, 50, da 1ª Vara do município, condenou Moraes e o semanário a pagar 2.500 salários mínimos -1.800 ao juiz Antônio José Magdalena, 45, titular da 2ª Vara, e 700 ao promotor Carlos Henrique Aparecido Rinard, 33.
Com os R$ 45 mil de custos do processo, as duas sentenças prevêem o pagamento de R$ 345 mil.
O juiz e o promotor alegam que foram vítimas de ataques e danos morais pelo jornal, em diversas reportagens dos últimos cinco anos.
"Isso representa a pena de morte para o jornal", diz Sérgio Moraes, que, na última quinta-feira, fez um depósito judicial no valor de R$ 50.248,73 para poder apresentar recurso ao Tribunal de Justiça de São Paulo.
"A empresa jornalística é uma empresa como outra qualquer, responde, nos termos da lei, por riscos criados com o desenvolvimento das próprias atividades", diz o juiz Antônio Magdalena.
Autocensura
O "Debate", com seis funcionários, fatura mensalmente cerca de R$ 8.000. Tem sede própria, que, segundo Moraes, está avaliada em R$ 80 mil. O jornalista ainda é sócio da gráfica que, com uma off-set, imprime o jornal.
Para ele, sua condenação destaca o que, na sua opinião, é o grande defeito do projeto de Lei de Imprensa que tramita no Congresso: a falta de limites para os valores de indenizações.
"Isso vai criar a pior censura, a autocensura, que, de certa forma, nós estamos praticando aqui."
Ele diz que, como se encontra, a nova lei inibirá o surgimento de novos veículos. "Passa a ser uma profissão de alto risco. Montar uma padaria, uma farmácia é um comércio normal; jornal passa a ser de alto risco."
Já o juiz Magdalena critica o limite para as indenizações. "Não há como limitar o que seja o alcance da ofensa", diz. No caso de sua ação contra o "Debate", ele afirma que o valor foi definido com base em outros casos e para combater novos "ataques" do jornal.
"As ações visam desestimular novas agressões. No caso, a indenização foi necessária a esse desestímulo", afirma.
Magdalena diz que a falta de limites aos valores não deve ser preocupação dos jornais "sérios". "Os veículos sérios vão verificar, vão se informar antes de veicular uma informação."
O promotor Carlos Rinard diz que o valor proposto em sua indenização -700 salários mínimos- deveria ser ainda maior.
"No meu caso, o valor foi muito baixo perto de toda a humilhação que caiu sobre mim", diz. Ele afirma que o principal objetivo da ação -segundo ele, evitar novos "ataques"- não foi atingido.
"Combativo"
O prefeito de Santa Cruz do Rio Pardo, Clóvis Guimarães Teixeira Coelho, 59, sem partido, defende a existência do "Debate", o único jornal da cidade, apesar de destacar que já teve problemas com o semanário no passado.
"É um jornal independente, mas é bom que se diga que, dentro da sua independência, ele tem lá suas falhas", diz Coelho.
Para ele, o seu possível fechamento seria "lamentável, para Santa Cruz e para a região". "Eu acho que, dentro das circunstâncias, vai ser muito difícil aparecer um outro órgão como o 'Debate', que seja combativo."
No mês passado, o "Debate" chegou a 20 anos de existência. Uma edição comemorativa ajudou o jornal a obter, por meio de anúncios, o dinheiro para o depósito judicial, necessário à apresentação do recurso no Tribunal de Justiça.

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