São Paulo, domingo, 26 de outubro de 1997
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Schumacher tenta ir para 'classe superior'

JOSÉ HENRIQUE MARIANTE
DO ENVIADO A JEREZ

Michael Schumacher fará história hoje se garantir seu terceiro título mundial. Nem tanto por se tornar o oitavo piloto a conquistar um tricampeonato na F-1.
Mas mais por transformar a Ferrari em um carro novamente vencedor. A equipe italiana, de longe a mais festejada da F-1, não vê um piloto campeão desde 1979, quando o sul-africano Jody Schekter conquistou o Mundial.
A oportunidade, marcada para se abrir só na próxima temporada pelos primeiros planos do próprio piloto, surgiu já nesta temporada.
E é difícil acreditar que Schumacher não a aproveitará, se tiver condições para isso.
É, de forma incontestável, o melhor talento que surgiu no automobilismo depois do brasileiro Ayrton Senna, mas, a exemplo do rival de hoje, Jacques Villeneuve, ainda luta por algum tipo de reconhecimento.
A briga de Schumacher, no entanto, é diferente da levada pelo oponente. Ele não precisa calar os críticos ou convencer o público.
Sua batalha pessoal acontece em outro nível.
Ele precisa mostrar que pertence à classe superior do esporte, algo que a morte de Senna, em 1994, até então o adversário a ser batido, não lhe permitiu.
Sem rivais na pista, o desafio de tornar a Ferrari campeã o seduziu -sem falar na oferta salarial irrecusável, supostos US$ 30 milhões por ano, o maior contrato da F-1 em todos os tempos.
Schumacher, porém, ainda precisa vencer outro obstáculo.
Ser tratado como um verdadeiro herói em seu próprio país e não como uma imagem criada a partir do marketing agressivo de seu empresário, Willi Weber, que vende mais de 200 produtos com a assinatura de seu piloto na Europa.
Um esquema bastante rentável, mas que afasta Schumacher das outras grandes personalidades do esporte alemão, como, por exemplo, o ex-jogador de futebol Franz Beckenbauer ou o tenista Boris Becker.
Analistas locais vão mais longe. Não seria apenas o artificialismo que cerca o esporte atual que estaria prejudicando Schumacher.
Mas também seu próprio modo de ser, "alemão demais para os alemães", como descreveu um jornalista de Munique.
Sério, econômico, casado e pai de uma filha, Schumacher parece correto demais para parte da juventude do país, que busca cada vez mais contestar uma sociedade padronizada ao extremo.
Vive de maneira espartana numa vila particular da Suíça, onde passa as horas livres se dedicando a trabalhos manuais e assistindo a programas humorísticos na TV.
O fenômeno Schumacher, visto dessa forma, parece anacrônico demais perto de uma Love Parade, a grande festa anual de Berlim, que lidera a propalada revolução techno, a última, segundo seus defensores, da cultura contemporânea.
Schumacher, filho de pedreiro e que só decolou no automobilismo por ter sido bancado por um amigo da família, talvez tenha surgido tarde demais.
Ao lado de Heinz-Harald Frentzen e do austríaco Karl Wendlinger, foi recrutado para fazer parte do Team Junior da Mercedes, um ambicioso projeto de formação de jovens pilotos.
Decolou rapidamente e chegou à F-1 em 91. Acabou contratado pela Benetton, onde conquistaria o bicampeonato em 94 e 95.
Com a Ferrari, onde está desde 96, tem contrato assinado até 99.
Mas já especula-se que a Mercedes, após a ressurreição ferrarista, estaria voltando a assediá-lo.
Algo improvável por enquanto, mas que pode acabar se tornando um novo desafio para quem pensava já ter vencido todos.
(JHM)

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