São Paulo, domingo, 26 de outubro de 1997
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Eleição favorece mais violência na Argélia

IGOR GIELOW
ENVIADO ESPECIAL A ARGEL

As eleições locais ocorridas na última quinta-feira na Argélia foram desenhadas pelo presidente Liamine Zeroual como uma forma de resolver seus diversos problemas políticos, a começar pela violência que assola o país.
Além de não solucionar essas questões, a combinação do resultado eleitoral e a renovada suspeita de fraude no pleito apenas criaram condições para mais derramamento de sangue na Argélia -que já assistiu a entre 60 mil e 100 mil mortes nos últimos cinco anos.
O primeiro objetivo de Zeroual foi o de legitimar seu mandato, que começou no fim de 1994 por indicação da junta militar que deu o golpe contra os islâmicos da FIS (Frente Islâmica de Salvação) em 1992 e continuou em 1995 com sua eleição em um pleito contestado.
Fracassou. As tintas democráticas que queria aplicar ao sistema político argelino se esmaeceram devido às denúncias de intimidação, fraude e à violência da campanha -na qual cerca de 20 candidatos foram assassinados, segundo acusações de líderes partidários.
Para o Ocidente, interessado nesse país do norte da África mais pelos 21 anos de petróleo e 71 anos de gás natural que ele ainda dispõe do que por sua vida política, se a violência não piorar, Zeroual pode significar alguma estabilidade.
Agora ele controla a câmara baixa do Parlamento e poderá, com as mais de 50% de cadeiras em conselhos provinciais que elegeu, indicar a maioria da nova câmara alta.
O problema é que a violência tem tudo para voltar, e ainda pior.
Isso porque o resultado eleitoral de quinta trouxe uma variante nova ao jogo político: o afastamento do MSP (Movimento por uma Sociedade Pacífica) do centro do poder. O partido é a maior agremiação islâmica moderada do país -elegeu 68 deputados na eleição parlamentar de junho (contra 157 da RND, Reunião Nacional Democrática, o partido de Zeroual).
Adotando uma política dúbia (faz parte do governo, mas também o critica), o líder do MSP, Mahfoud Nahnah, ficou surpreso com o terceiro lugar obtido por seu partido na quinta.
Nahnah, segundo colocado nas eleições presidenciais de 1995, chegou a mudar o nome de seu partido para poder fazer parte do jogo -era Hamas, acrônimo árabe para Movimento da Sociedade Islâmica, mas uma nova lei em 95 impedia qualquer referência ao Islã na política partidária.
Agora, sentiu-se desprezado nas urnas, ainda mais em uma eleição sobre a qual pesa forte suspeita de manipulação por seus aliados.
Logo, pode se aproximar novamente da FIS, cujos líderes no exílio buscam uma forma de voltar à cena política. Uma trégua foi anunciada no final do mês passado pelo braço armado da frente, o Exército Islâmico de Salvação.
O descrédito nos processos eleitorais, porém, pode jogar os moderados islâmicos, a FIS e grupos mais extremistas (como o Grupo Islâmico Armado -GIA, a quem se atribuem os últimos e mais sangrentos massacres do país) numa mesma rota em direção à luta armada, que seria considerada a única maneira de tirar do poder os atuais líderes laicos.

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