São Paulo, domingo, 26 de outubro de 1997 |
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Imprensa foi monitorada
IGOR GIELOW
A obsessão com a segurança dos profissionais, justificável pelo histórico de violência contra jornalistas estrangeiros e locais, levou alguns correspondentes a suspeitar das intenções do governo. O controle começou na chegada ao aeroporto. Todos os jornalistas credenciados eram separados em um canto da sala de imigração. Quem não tivesse o visto profissional seria deportado imediatamente -não se sabe de nenhum caso. A Folha foi o único jornal brasileiro a obter o credenciamento oficial do governo argelino, segundo o Comitê Internacional de Imprensa de Argel. Após as formalidades no aeroporto, onde cada jornalista já tinha sua ficha de admissão pronta, era a hora de esperar a condução oficial. Ela consistiu, no grupo com o qual a Folha chegou, em cinco táxis e pelo menos dois carros de escolta. Destino: o hotel El Aurassi, de propriedade do governo e onde todos os profissionais estavam hospedados. Uma vez no hotel e registrado, o jornalista descobria que não podia sair às ruas de Argel desacompanhado. Segurança, ou melhor, a falta dela, era a justificativa. Saídas, só com pedidos específicos. Todos os que a Folha fez foram atendidos, mesmo quando o compromisso era uma entrevista com um líder oposicionista. Nesse caso, dois carros acompanharam o táxi com jornalistas até o comitê do Partido dos Trabalhadores argelino. Uma visita ao Casbah, bairro tradicional da capital, levou ao exagero de 11 homens armados protegerem quatro jornalistas. Sair de Argel era mais complicado. É impossível deixar a capital rumo aos locais dos massacres mais recentes sem escolta militar, por exemplo. Foi o que ocorreu na quarta-feira. O repórter da Folha, um jornalista inglês, outro holandês e um suíço foram colocados na caçamba de um jipe do Exército. À frente, cinco soldados armados com fuzis Kalachnikov. O comboio, que incluía outros jornalistas, foi para Sidi Rais e Bentalha -locais onde morreram, em massacres, quase 600 pessoas. Uma vez em Sidi Rais, o morador que deu entrevistas confessou que havia sido escolhido para falar e que aquela bandeira da Argélia no que sobrou de sua casa não era idéia dele. Um cinegrafista do Exército, simpático e contador de histórias, acompanhava tudo. Sua verdadeira função, porém, se mostrou na localidade de Bentalha, onde nem todos haviam sido orientados pelos militares. Quando um repórter falava com alguém, imediatamente o cinegrafista filmava seu trabalho e o rosto de quem estava falando -que mudava o tema para o tempo ou futebol com medo de represálias. Essa coerção se repetiu no dia da eleição, quinta-feira, quando equipes de repórteres foram visitar os locais de votação. Só que, nesse caso, o cinegrafista era da TV estatal argelina. Todos os movimentos dos repórteres, cinegrafistas, fotógrafos e outros profissionais da imprensa eram controlados. Para entrar e sair do hotel, apenas na hora marcada e com o nome registrado. Não houve nenhuma indelicadeza por parte da organização, pelo contrário. Mas era claro que seu objetivo era tentar mostrar apenas aquilo que interessava ao governo. O que acabou não acontecendo devido à espontaneidade dos argelinos, pelo menos até a câmera oficial chegar. (IG) Texto Anterior: Eleição favorece mais violência na Argélia Próximo Texto: Extremismo argelino nasceu em 32 Índice |
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