São Paulo, domingo, 26 de outubro de 1997
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Educação

1 - Qual a idade ideal para a criança começar na escola?
Educadores concordam que as crianças são colocadas na escola cada vez mais cedo em função da organização familiar. Pais e mães trabalham e não têm com quem deixar os filhos. Silvia Macedo Chiarelli, diretora da Escola Alecrim, que já recebeu bebês de quatro meses em seu berçário, diz que entre a mãe deixar a criança com uma babá e colocá-la na escola, o melhor é optar pela escola.
"Babás podem ir embora de uma hora para outra, fazendo desaparecer a relação com a criança. A escola garante o vínculo com o adulto. Além disso, na pré-escola, as crianças adquirem um jogo de cintura que antes só tinham a partir do 1.o grau."
Crianças que antes frequentavam a escola a partir dos três ou quatro anos de idade, agora ingressam antes dos dois anos. "Os pais precisam se sentir seguros para tirar a criança de casa e levá-la para a escola quando ela começa a dar indícios de que não basta só ir ao playground ou à praça", afirma Silvia.
2 - A quem cabe a escolha do colégio: ao pai, à mãe ou à própria criança?
Na maior parte dos casos, a escolha é uma composição. Os pais tendem a fazer a opção na pré-escola e no 1.o grau, eventualmente dando preferência à escola que frequentaram. A partir do 2.o grau, essa decisão cabe aos filhos, que devem procurar consultar os pais antes de se definirem.
3 - Os filhos devem estudar todos na mesma escola?
Sim, do ponto de vista prático, ou seja, da rotina da família em relação a transporte, reuniões de pais e ao contato com professores. Luiz Eduardo Cerqueira Magalhães, diretor-geral do Colégio Santa Cruz, diz que esse é um fator que ele considera durante o processo de seleção dos alunos. "Não dá para excluir o quinto filho de uma família que já tem outros quatro na escola." Mas não é porque um filho deu certo em determinado colégio que os irmãos vão se adaptar também.
4 - É recomendável que a criança permaneça na mesma escola, do início ao fim de sua educação?
Apenas no caso de a escola ser grande e oferecer diversidade durante a formação da criança. Além disso, o aluno deve estar adaptado, mostrando bom rendimento e bom relacionamento com colegas e professores. A permanência numa única escola pode ser um fator negativo no caso de grupos pequenos (cerca de oito a dez alunos por classe) porque tende a criar um ambiente protetor.
5 - Com que idade a criança deve começar a estudar uma língua estrangeira?
Quanto mais cedo melhor porque se torna cada vez mais importante ter conhecimento de uma segunda língua. "É primordial para o trabalhador do século 21", diz Elisa Maria Loureiro S. Pereira, diretora pedagógica do Pueri Domus. O método empregado no ensino de crianças com menos de cinco anos geralmente envolve jogos, músicas, histórias e filmes. Se o ensino da língua estrangeira na escola for insuficiente, pode ser reforçado com aulas em escolas especializadas. O inglês é adotado como disciplina obrigatória na maioria das escolas desde o 1.o grau. Algumas ainda incluem francês, alemão ou espanhol no currículo.
6 - Qual a infra-estrutura básica que uma boa escola deve oferecer?
Além de salas de aula em ótimo estado, as escolas devem contar com biblioteca, minibiblioteca na classe, quadras esportivas, piscina, computadores, laboratórios, restaurante ou lanchonete, ateliê de arte e oferecer condições de segurança.
7 - Computador é recurso essencial na educação moderna?
Cresce imensamente o número de alunos que são usuários de computador, mas nem por isso as escolas têm a pretensão de formar alunos em informática. Computadores são utilizados como mais um recurso pedagógico, para habilitar os alunos a digitarem e ilustrarem trabalhos e fazerem consultas até pela Internet, a rede mundial de computadores.
No Colégio Santa Cruz, por exemplo, não existe uma disciplina chamada computação. Atividades com computadores são introduzidas a partir da 5.a série por meio de quatro disciplinas (português, história, ciências e línguas). Alguns colégios já dispõem de site próprio na Internet, com informações sobre projeto de ensino, instalações, corpo docente etc.
8 - As escolas devem manter programas de orientação sexual e prevenção às drogas?
Segundo o psiquiatra e consultor de escolas Içami Tiba, o ideal é que os alunos sejam envolvidos em atividades relacionadas com esses temas e que os pais possam participar também. A escola não se limita a ensinar os alunos, mas deve influir e orientar no processo de sociabilização. Temas como sexo e droga, que antes eram abordados apenas pela família, passaram a ser assunto de trabalho para as escolas.
9 - Há limite para atividades extracurriculares e/ou paralelas?
O limite deve ser imposto pela criança. Há pais que sobrecarregam os filhos com atividades paralelas para resolverem seus próprios problemas: não querem deixar as crianças sozinhas em casa.
Elisa Pereira, do Pueri Domus, diz que o colégio adota o sistema de parcerias com escolas especializadas, que inclui aulas de natação, inglês, balé e judô. "Sugerimos no máximo duas parcerias para não estressar as crianças. E ainda sobra tempo para as crianças brincarem."
Os pais também acabam sendo beneficiados porque são poupados do trânsito, uma vez que as atividades acontecem dentro da escola (apenas para crianças matriculadas no programa de escola ampliada).
10 - Uniforme é bom ou ruim?
As escolas recomendam, e os alunos rejeitam. O uso de uniforme é indicado para atividades específicas como aulas de educação física e participação em passeios e excursões. No primeiro caso, por uma questão de praticidade e conforto. No segundo, porque ajuda a identificar os alunos da escola.
"O uniforme é útil em determinadas fases, principalmente para as crianças pequenas como uma forma de auxiliar a colocar em ordem, a seriar. Se vestem uniforme, elas estão prontas para estudar, assim como se estiverem vestidas com roupa de índio tendem a agir como tal", diz Içami Tiba.
Para o secretário-adjunto da Secretaria Estadual de Educação de São Paulo, Hubert Alquéres, "o uso de uniforme deve ser uma decisão da escola e da comunidade, não uma regra geral". Em regiões de periferia, diz ele, o uniforme garante segurança ao identificar quem é aluno da escola e quem é traficante, por exemplo.
11 - Deve haver, por parte das escolas, preocupação com religião?
A questão da obrigatoriedade do ensino religioso em escolas públicas de São Paulo é novamente tema de discussão. Muitos educadores acreditam que a obrigatoriedade onera o Estado com uma responsabilidade que não cabe a ele assumir.
O objetivo da rede pública é a diversidade para atingir o maior número de alunos possível e não a segmentação, nesse caso por meio da religião. A decisão de colocar, ou não, o filho em uma escola de orientação religiosa vai depender dos valores de cada família.
12 - Quanto custa a educação dos filhos?
Custos com mensalidade escolar em São Paulo variam entre R$ 300 e R$ 600. Nas escolas bilíngues, o preço pode superar R$ 1.000. A escolha vai depender da situação financeira de cada família. É importante que, além da mensalidade, os pais tenham condições de arcar com atividades extras promovidas pela escola, como viagens. O entrosamento depende também dessas programações fora da sala de aula.
13 - Quanto tempo a criança deve passar na escola?
Pelo menos cinco horas para que possa cumprir a carga horária básica de educação formal e acadêmica. Esse período pode ser estendido com atividades extracurriculares e/ou paralelas. Mas muitas escolas brasileiras não estão suficientemente equipadas para ficar com o aluno o dia inteiro.
14 - O tamanho da escola é importante?
Para Hubert Alquéres, da Secretaria Estadual de Educação, o tamanho da escola varia de acordo com o segmento. Da 1.a a 4.a série, é recomendável uma escola pequena para a criança receber tratamento individualizado nessa etapa de seu desenvolvimento. Da 5.a a 8.a série, os pais devem avaliar o perfil da criança, levando em conta que ela não deve ser muito "paparicada" nessa fase.
A partir do 2.o grau, o ideal é uma escola maior para que o aluno possa ter contato com pessoas diferentes com o objetivo de se "desinibir" e se "desembaraçar". Nenhuma faculdade vai ficar passando a mão na cebça do aluno, e ele já deve ir se preparando para isso.
15 - Qual o limite do número de alunos por classe?
Nos Estados Unidos, cada classe tem em média 18 alunos. Em Taiwan, esse número salta para 65. "Apesar disso, os alunos continuam apresentando alto rendimento escolar", afirma Alquéres. No Brasil, a média é de 30 a 35 alunos por sala de aula no 1.o grau e de 40 alunos por classe no 2.o grau.
16 - A disciplina adotada pela escola conta pontos no momento da escolha?
Disciplina, diz a professora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), Marília Pontes Sposito, não é obediência cega à regra. "Disciplina é adesão voluntária a um conjunto de regras que possibilitam a convivência. É como a concepção de cidadania, que envolve democracia e tolerância."
Segundo ela, não há espaço para a construção de regras por causa da distância entre os pais e a escola. "As famílias, às vezes, delegam à escola colocar limites porque não conseguem fazê-lo e vice-versa. Um joga para o outro a responsabilidade de disciplinar", afirma.
17 - Qual a participação dos pais na educação dos filhos?
A educação deve, de preferência, ser planejada a seis mãos (pai, mãe e escola). A educação escolar tem de ser harmoniosa e coerente com a educação familiar.
O critério de escolha do colégio deve passar necessariamente pela participação dos pais. Deve haver um canal de comunicação entre a família e os educadores no momento de discutir o projeto pedagógico e tomar decisões.
18 - Como escolher entre as diferentes metodologias?
Os principais métodos pedagógicos adotados por escolas brasileiras são: construtivismo, construtivismo pós-piagetiano, pragmatismo, Maria Montessori, antroposofia e ensino tradicional.
Segundo o construtivismo, proposto pelo filósofo Jean Piaget (1896-1980), os professores devem respeitar a curiosidade do aluno, deixando que a sugestão de temas e atividades partam dele também e não apenas da escola.
Uma aluna de Piaget, a argentina Emilia Ferreiro, ampliou o conceito, sugerindo que as crianças podem se alfabetizar por conta própria desde que o ambiente seja favorável ao aprendizado. É a base do construtivismo pós-piagetiano.
Na proposta de método pedagógico de Montessori (1870-1952), a criança torna-se responsável por seu aprendizado, e o professor é um auxiliar no processo.
De acordo com o pragmatismo, elaborado pelo norte-americano John Dewey (1859-1952), a inteligência é encarada como o principal instrumento do saber.
A antroposofia, ou pedagogia Waldorf, do filósofo alemão Rudolf Steiner (1861-1925) combina desenvolvimento físico, social e individual da criança. Os alunos passam a ser agrupados por faixa etária e não por série.
O ensino tradicional privilegia visão conteudista, professor e sistema de avaliação em detrimento do conhecimento mais analítico.
19 - A escola deve fornecer orientação vocacional?
"A escola tem de dar uma luz porque os alunos ainda são muito jovens quando fazem sua escolha e devem se preparar para enfrentar um mercado de trabalho complicado. Às vezes, mesmo com essa orientação, a criança não consegue se decidir", afirma Elisa Pereira.
As opções são: levar profissionais para dar palestras relatando suas experiências, formar grupos de pesquisa e discussão entre os alunos, organizar visitas às universidades. No caso do Pueri Domus, alunos do 2.o grau produzem um caderno das profissões apresentando a situação do mercado de trabalho.
"Recebo alunos que irão deixar a escola em 2010, que entrarão no mercado de trabalho nessa época. A escola precisa de uma estratégia de planejamento para preparar esse aluno", afirma Cerqueira Magalhães, do Santa Cruz.
20 - Os pais devem forçar crianças quando elas resistirem a ir para a escola?
No início, a escola deve promover um período de adaptação, permitindo o acesso direto dos pais (ou qualquer pessoa que tenha forte relação com a criança) à escola para compartilhar desse espaço com o aluno por alguns dias.
Cabe à escola garantir a segurança, higiene, alimentação e cuidado das crianças, dando segurança aos pais quando eles não estiverem mais presentes.
21 - Processos de seleção como vestibulinho (para crianças) e vestibular são prejudiciais?
Na opinião de Içami Tiba, a resposta é afirmativa se a vida dos pais dependerem desse exame. "Se a decisão de se submeter ao teste partir da criança, ela é saudável. Geralmente são os pais que atrapalham esses processos de seleção."
No caso do vestibulinho, em que são avaliadas prontidão, habilidade numérica e alfabetização da criança, os pais devem ter conhecimento prévio da situação para evitar que as crianças sejam submetidas a dificuldades que não podem enfrentar. Geralmente, essas situações não podem ser muito diferentes das que as crianças enfrentam em seu dia-a-dia na pré-escola.
22 - O cursinho é indispensável atualmente?
Não. Se o aluno frequentou uma escola forte e estudou como deveria ele conseguirá entrar em uma boa faculdade.
23 - É comum querer mudar de curso no primeiro ano da faculdade?
É bastante usual porque muitas vezes os jovens não estão preparados para fazer a opção profissional ao fim do 2.o grau. Educadores defendem a mudança no meio do caminho para evitar que o aluno insista na escolha do curso e se torne um profissional frustrado e insatisfeito.
24 - Como ajudar os filhos a escolher uma profissão?
Os pais devem evitar exercer pressão sobre os filhos no momento da decisão profissional porque, com isso, podem excluir possibilidades. Educadores são favoráveis ao diálogo, troca de idéias e até ao relato das experiências profissionais dos pais. Intercâmbios culturais podem ajudar também a criança a expandir sua visão de mundo.
25 - É melhor mudar de escola quando o aluno repete de ano?
"A repetência, muitas vezes, não é problema do aluno, mas da falta de adaptação à proposta pedagógica de determinada escola. No Brasil, há a cultura da repetência porque acham que reprovar é bom. O aluno repetente acaba estigmatizado pelos colegas e pelos professores. Mudar de escola pode ajudar a acabar com o preconceito", afirma Alquéres, da Secretaria Estadual de Educação.
26 - É importante a escola ser perto de casa?
Sim, do ponto de vista da praticidade já que poupa tempo de pais e filhos. Mas não deve ser o único critério no momento da escolha do colégio. A distância entre a escola e a casa não pode ser tão grande a ponto de impedir que a criança participe de atividades extraordinárias fora do período de aula.
27 - Como escolher entre escola pública e particular?
Para a professora Marília Sposito, da USP, é ilusão achar que o ensino particular atualmente é superior ao ensino público. "Muitas escolas da rede pública fazem exatamente o que estão fazendo as da rede particular."
Na sua opinião, os pais devem exercitar mais sua capacidade de escolha e não se empolgar com a aparência do colégio, que costuma apresentar um vasto cardápio de novidades para atrair alunos. "Ninguém mais mergulha na filosofia da escola. Os pais deveriam investigar melhor a escola. A família pode estar pagando caro pela educação dos filhos e ao mesmo tempo a escola não investe na formação nem na remuneração de seus professores", diz.
28 - Qual o papel da escola na formação ética da criança?
A ascendência vai depender de quanto a escola estiver presente na vida do aluno. A escola pode acabar influenciando não por um aspecto determinado e intencional, mas pelo fato de seus professores estarem servindo como modelo, por exemplo.
Ética, na opinião da professora da Faculdade de Educação da USP, Marília Sposito, não é criar uma disciplina de educação moral e cívica, mas pensar sobre as regras de conduta e de ação.
"Como as escolas podem ensinar o que não praticam? Como ter coerência entre o que dizem e o que fazem? Como elas podem colocar essa questão se há a discussão no momento sobre o abuso no preço das mensalidades?", pergunta.
29 - Qual a importância do diploma universitário?
Segundo Cerqueira Magalhães, do Santa Cruz, "hoje em dia, o diploma desapareceu do mercado de trabalho. O que vale é educação e atualização permanentes".
Para Hubert Alquéres, o diploma adquiriu importância secundária. "Atualmente, são valorizados também, além do diploma, o conhecimento de informática e de língua estrangeira, a experiência com viagens ao exterior, a iniciativa, a capacidade de se comunicar verbalmente e a informação sobre temas da atualidade." Segundo ele, os educadores devem dar condições para que os alunos de hoje possam se inserir no mercado de trabalho no futuro. "Assistimos a uma grande transformação na educação que é reflexo das tendências de hoje-prioridade a temas como a preservação ambiental, cidadania, orientação sexual e drogas. O efeito dessa transformação só será perceptível daquia dez anos."
30 - Quais as chances de um profissional formado em uma faculdade menos prestigiada?
Quem estudou numa faculdade de menos prestígio pode ser bem-sucedido profissionalmente, na opinião de Alquéres, se preencher os outros requisitos mencionados acima.

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