São Paulo, terça-feira, 28 de outubro de 1997
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'El Niño' chega ao mercado

JOÃO CARLOS DE OLIVEIRA
EDITOR DO PAINEL S/A

Está sendo como um "El Niño" financeiro. As Bolsas no mundo foram desmoronando com o passar do tempo e do fuso horário. E seu efeito, como indica o fechamento da Bolsa de Nova York, ainda não terminou. Há mortos e feridos.
A transferência de renda provocada por esse processo é avassaladora. Só ontem, US$ 350 milhões trocaram de mãos no mercado futuro da Bolsa brasileira.
No Brasil, o carro-chefe do mercado acionário, a Telebrás, desabou e fechou cotada a R$ 116,50 o lote de mil ações. Em Nova York, que fechou depois, os ADRs de Telebrás foram cotados a R$ 106,13. Ou seja, hoje, tudo indica, a Bovespa abre de novo em baixa.
Os fundamentos, asseguram os analistas, não mudaram. Ou seja, o Brasil não está hoje pior ou melhor do que era na quarta-feira passada.
Mas a percepção de risco aumentou -e não só do Brasil ou da Argentina. De todos.
A crise está provocando um realinhamento dos preços relativos em todos os mercados. Um realinhamento praticamente on line e, por enquanto, só para baixo.
A discussão, portanto, não é exatamente se Telebrás está ou não barata -e parte do mercado acredita que ficou mesmo barata-, mas se o preço pago por ela está em linha com o pago pela telefônica do México ou pela AT&T, por exemplo.
Logo, quanto mais alavancado for o mercado, maior será sua queda. Mais instituições vão buscar "zerar" suas perdas e posições -ao preço que for.
Em uma economia globalizada, a busca por "zerar"perdas é também globalizada. E os eventuais saques nos fundos também são globalizados e, por isso, certamente, a poeira ainda não assentou.
Assim, apurou a Folha junto a analistas de bancos estrangeiros que preferiram que seus nomes não fossem mencionados, de pouco adiantaria o BNDES, por exemplo, tentar sustentar o preço de Telebrás antes de o próprio mercado encontrar o fundo-do-poço.
O esforço poderia, na prática, apenas ajudar a fornecer os reais necessários para que investidores estrangeiros pudessem comprar dólares e sair do mercado brasileiro.
E está havendo mesmo saída -tanto nas Bolsas como na área da renda fixa. E vai continuar havendo saídas.
O juro pedido lá fora para investir no Brasil mais que dobrou desde a crise que se iniciou em Hong Kong. Aqui, no futuro, as taxas explodiram.
Na quarta-feira, o C-Bond, um dos mais negociados títulos das dívida externa brasileira, pagava 3,7% de juro acima do que paga o título norte-americano de 30 anos. Ontem, foi negociado pagando 7,8% acima.
Há quem espere para hoje uma alta dos juros no over -as taxas se aproximariam da Tban (o teto da banda de juros).
É que o investidor estrangeiro que aplica em renda fixa no Brasil em um horizonte de curto prazo (e que não quer correr o risco cambial) está recebendo um juro de 9,4% ao ano. Só para ganhar aqui o mesmo que ganha lá fora em um C-Bond a taxa deveria ser de 14%.
Há consenso no mercado de que o Banco Central hoje terá que levantar sua linha de defesa. Basicamente, espera o mercado, vai vender títulos cambiais e mostrar que o país banca sua política de desvalorização lenta e gradual do real.

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