São Paulo, quinta-feira, 30 de outubro de 1997
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O dono do buraco

JANIO DE FREITAS

É pior do que desculpa tola, é falsificação deliberada dos fatos a pretensa resposta do ministro Paulo Renato Souza à divulgação de que os 33 milhões de crianças das escolas públicas estão ameaçados de ficar até o fim do ano sem merenda escolar, atrativo maior para o aprendizado de milhões deles, porque o Ministério da Educação não tem dinheiro para a respectiva despesa.
O buraco não foi feito por aumento de custo, como diz Paulo Renato. A verba para este ano foi cortada na montagem do Orçamento, orientada pelo tecnocratismo do ministro Antonio Kandir, e o tecnocratismo do ministro Paulo Renato aceitou o corte muito bem. A verba orçamentária ficou R$ 88 milhões aquém do necessário que o próprio Ministério da Educação orçara para sua contribuição à merenda.
Ao impulso do mesmo conflito com os fatos, Paulo Renato atribuiu as críticas à mediocridade atual do seu ministério, até suaves em comparação com o merecido, a um tal jogo eleitoreiro de petistas que não deram contribuição alguma, em Estado nenhum, para soluções na educação.
É notório que o economista Paulo Renato caiu sem pára-quedas no seu ministério, porque José Serra tomou-lhe o Planejamento no último minuto antes da posse geral e, para justificar sua nova retribuição pelos serviços na campanha de Fernando Henrique, era possível lembrar que foi uma espécie de reitor-contador na Unicamp -onde foi, também, um dos cabeças mais radicais de uma greve contra arrocho dos salários de professores, um arrocho menor do que o avalizado pelo ministro Paulo Renato.
Apesar da destinação inadequada, Paulo Renato poderia saber, até por leitura de jornais, que o maior êxito em ensino municipal, segundo estudo mundial da ONU, foi de uma prefeitura petista no Ceará. E que ao alcance dos seus olhos está a grande inovação em ensino, também já consagrada como modelo para o mundo, que é a bolsa-escola do governo de Cristovam Buarque, petista embora não-sectário.
Dessa inovação, aliás, Paulo Renato pode tomar conhecimento por um meio fácil: é só ouvir uma propaganda oficial que, referindo-se à sua área, diz que o governo "criou a bolsa-escola" -o que, além de mentira e plágio, é apropriação indébita.
Salvação à vista
O momento é de inquietação, com perdas sucessivas e vexames não menores, o sentimento do desastre consumindo almas e unhas. Mas tranquilizai-vos Conys e Matinas e Kfouris e demais investidores de emoções nas desvalorizadas camisas de Fluminense e Corinthians. Ou de Bahia, Cruzeiro e outros assim menores. Sossegai porque tudo já se vai arranjando para poupar-vos, e aos demais ameaçados, do rebaixamento humilhante para a merecida segunda divisão.
Na convivência maior que o projeto de Pelé provocou entre dois gêneros de políticos -os do futebol e os do Congresso- os interesses coincidiram também na inconveniência do previsível rebaixamento de clubes com tanta torcida, quer dizer, com tantos eleitores. Mas repetir os lances de tapetão que antes salvaram Fluminense e Bragantino seria, agora, oferecer-se a um escândalo na hora mais imprópria, em vista do projeto Pelé.
Cartolas unidos jamais serão vencidos, de modo que já surgiu uma fórmula salvadora para os próprios e para os inquietos: sob a denominação de Liga Nacional, os 32 clubes seriam divididos em duas sérias, A e B, ficando em uma os que se fizeram merecedores de respeito, ao fim do atual campeonato, e na outra o resto. Depois, a disputa dos finalistas de ambas.

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