São Paulo, sexta-feira, 31 de outubro de 1997
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Pintor viveu a liberdade

MARCELO REZENDE
DA REPORTAGEM LOCAL

O maior mistério em Salvador Felipe Jacinto Dalí (1904-1989) é que os fatos nunca deram conta de sua vida e, pela opção estética que fez no final dos anos 20, uma escolha radical em Paris, a ficção também pouco conseguiu com ele.
O que é então mais surrealista? As pinturas de Dalí -o herói da cultura espanhola nascido em Figueras- ou seu inacreditável bigode e descontrolado amor por Gala, sua mulher e também, de muitas formas, sua mãe?
Mais um vez o surrealismo. O movimento indicava um novo caminho. A visita sem volta à terra dos sonhos e o engajamento no desequilíbrio da razão. A liberdade sem culpa.
Para muitos, não se tratava exatamente de uma vanguarda, e sim de uma religião. O papa, sacerdote-fundador, é André Breton (1896-1966) -o escritor francês que abandonou a medicina para tornar-se, em 1924, um Freud para o seu tempo.
Para Dalí esse contexto é precioso. Vivia como um libertário, mas jamais conseguiu abandonar sua cultura católica, que, muitas vezes, se convertia em admiração pela ordem, geralmente resgatada por meio da força. De certa forma, era um puritano.
Louco
As suspeitas estariam agora finalmente confirmadas. Tratava-se de um louco, essa a palavra mais usada pelo público para definir suas obras e suas ações.
Mas seus anos de formação não foram passados em um mundo exatamente sadio. Viu as idéias totalitárias avançarem na Europa e não se sentia muito confortável com o futuro anunciado pelos comunistas.
Sabia apenas que o homem tinha que mudar (e o surrealismo era mais uma tentativa) e apostaria nessa idéia, sempre tropeçando um pouco, escolhendo ao acaso o lado errado e correndo o risco de tornar-se um bufão.
Com os anos, sua obra deu espaço a sua personalidade. Importava mais o que Dalí dizia, e não o que produzia. Morreu doente e solitário, preferindo o silêncio. Seus biógrafos não lhe concederam um último pedido.

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