São Paulo, domingo, 2 de novembro de 1997
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Saco de maldades

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
EDITOR DE DOMINGO

Com o "saco de maldades" de Gustavo Franco aberto e perspectivas sombrias pela frente, dois discursos tendem a ser valorizados no plano político.
O primeiro deles, que já estava em circulação, mas ganha nova ênfase, é o da urgência das reformas constitucionais. O Congresso deve ser cada vez mais pressionado e responsabilizado, e o governo pode aproveitar o clima de comoção para apressar seus planos, especialmente na área fiscal -como revela, na edição de hoje, o jornalista Celso Pinto.
O outro, nacionalista, tenderá a atribuir à abertura econômica e à "globalização" (boa desculpa também para governistas) os abalos que o Brasil está sofrendo.
A esquerda já vai saindo a campo com seu "Um Brasil para os Brasileiros", programa "democrático e popular", escrito a não se sabe quantas mãos pelos luminares de PT, PDT, PSB e PC do B.
Talvez tenha-se formado no país uma rejeição extremada a tudo que tenha a ver com nacionalismo. Não é casual, há motivos que explicam, mas o fato é que na era tucano-liberal "nacional" virou palavrão. A colônia continua adorando tudo que é "importado", expressão de status social. Ainda assim, é de centro acadêmico a retórica nacionalista que se lê no tal programa. Uma volta triunfal aos anos 50, de onde a esquerda, na verdade, parece não ter saído.
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Pesquisa do DataFolha publicada na edição de hoje mostra que o saco de maldades da sociedade também pode ser aberto.
Juros em Plutão e ameaça de recessão não são boa política para quem pretende chegar a um segundo mandato.
É interessante notar que, apesar do calor da hora, as pessoas estão percebendo que a crise não é um problema só de Bolsa. As expectativas para o futuro estão bem mais pessimistas. Ao menos em São Paulo.
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Uma imagem para ficar na história, aquela do presidente da China em Wall Street, o templo financeiro do império capitalista.
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A propósito, a primeira revolução socialista comemoraria, na sexta-feira, seus 80 anos. Se a URSS estivesse de pé, o que seria o mundo hoje? A revolução foi uma idéia que ficou para trás ou o marxismo ainda retornará à cena?
A revista "New Yorker" publica edição especial sobre o que vem por aí ("next issue"). O filósofo cravado é ele mesmo, o velho Karl Marx. Muito "in", como se dizia.
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O inferno de Wall Street (título de um longo poema de Sousândrade -Brasil, o país dos Andrade poetas) durou pouco. A economia americana parece ir bem e o ajuste foi saudável para eles, a julgar pelo discurso, muito claro, de Greenspan, o Gustavo Franco dos ricos.
Já aqui, as chamadas inconsistências do modelão nos colocam na mira da especulação internacional. US$ 7 bilhões, o que se imagina que o governo perdeu com a crise, é dinheiro.
Como dizia um outro poeta, o diplomata Chico Alvim, num poema daqueles dos anos 70, "país mesmo é os Estados Unidos"...

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