São Paulo, domingo, 2 de novembro de 1997
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Instabilidade mundial deve se reduzir com juros norte-americanos estáveis

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

A especulação cambial e em Bolsa, em cada mercado, continuará dando sustos em muita gente nas próximas semanas, meses e anos. Sempre foi assim. A turbulência global, entretanto, tende a cair com a estabilidade dos juros nos Estados Unidos. Apesar dos tremores da semana passada, a economia mundial tem uma locomotiva. Se ela não descarrilar, os estragos tendem a ser localizados.
Regionalmente, os calores podem aumentar. A turbulência asiática parecia menos crítica no final da semana passada, mas a América Latina entrou na roda e o Brasil virou bola da vez.
A crise saiu da Bolsa e atingiu o coração da estabilidade, a taxa de câmbio. O Banco Central perdeu reservas e dobrou as taxas de juros.
Reservas internacionais são como armas atômicas. É bom tê-las e quem tem mais fica mais poderoso. Mas se for mesmo necessário utilizá-las, os riscos de catástrofe aumentam.
Países como China, Hong Kong, Indonésia, Malásia e Argentina, por exemplo, conseguiram aumentar seus estoques de reservas entre 1996 e 1997.
Alguns casos são impressionantes, como Israel, cujas reservas deram um salto de US$ 9,5 bilhões para US$ 18,2 bilhões, segundo a revista "The Economist".
Mesmo a Rússia, que tornou-se um caso clássico de transição caótica ao capitalismo, com hiperinflação e instabilidade política, conseguiu aumentar suas reservas de US$ 12,5 bilhões para US$ 20,2 bilhões.
A China tinha US$ 91,7 bilhões no ano passado. Agora tem US$ 127,8 bilhões. Hong Kong passou de US$ 55,4 bilhões, antes da devolução, para US$ 85,3 bilhões.
Somadas, as reservas atuais de China e Hong Kong passam dos US$ 213 bilhões. É a maior garantia contra ataques especulativos.
O problema é mais grave nos países cujas reservas estão caindo ou mesmo estagnadas.
A lista é eloquente e inclui os candidatos mais evidentes a vítimas no atual tiro ao alvo globalizado: Coréia do Sul (que tremeu junto com o Brasil na semana passada), Tailândia (cuja moeda continua em processo de desintegração e já foi desvalorizada em quase 80% desde julho) e, agora, o próprio Brasil.
Há um conjunto de países num terreno movediço, cujas reservas cresceram pouco ou ficaram na mesma e que vão da Grécia à Indonésia, Índia e Malásia, passando por Turquia, República Tcheca e Polônia.
É evidente que a probabilidade de um ataque não depende apenas do nível das reservas ou de elas estarem ou não caindo.
Outro indicador são as taxas de juros. Fazendo companhia ao Brasil, na Turquia os juros andam na casa dos 60%.
Na grande maioria dos emergentes, entretanto, a média dos juros de curto prazo está entre 15% e 20%. Ou seja, de três a quatro vezes mais altas que nos países centrais da economia mundial. Mas Brasil e Turquia convivem agora com taxas quase dez vezes superiores às dos Estados Unidos.
Mas os países que já fizeram a desvalorização cambial ou estão convivendo com regimes flexíveis de câmbio continuam com juros altos. O México, por exemplo, teve uma alta expressiva de reservas nos últimos 12 meses, tem um regime de câmbio flexível, mas tem juros da ordem de 17%.
A Coréia do Sul, que perdeu reservas e atravessa uma fase de enorme instabilidade cambial e financeira, ainda está com os juros em 13,75%. A Indonésia também conseguiu elevar suas reservas, mas continua com os juros de curto prazo na faixa dos 30%. Todas essas taxas de juros, para operações de 3 meses, têm seus valores expressos em termos anuais.
O destino dos países em desenvolvimento depende de cada um deles conseguir aumentar as reservas e reduzir juros ao mesmo tempo. O modo mais elementar de atingir esse objetivo é exportar cada vez mais.
Se a economia norte-americana continuar crescendo, sem inflação e portanto com juros estáveis ou declinantes, um cenário de transição com traumas localizados torna-se plausível. Ainda que para cada governo, em cada economia, o inimigo continue invisível.

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