São Paulo, domingo, 2 de novembro de 1997
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Mobilização contra a crise

LUÍS NASSIF

O amplo know-how de crises de Bolsas, a partir da experiência dos anos 80, indica que no dia seguinte ao epicentro do terremoto o mundo acaba sendo sempre melhor do que apostam os "baixistas" e pior do que supõem os "altistas".
No mercado, tudo se ajusta pelo preço. Quando o país está "caro" para determinado nível de preço, a tendência do mercado é supervalorizar todas as más notícias.
Com as ações caindo de preço, o país continua o mesmo, mas fica "barato" e as avaliações mudam de figura. As boas notícias passam a ser supervalorizadas.
Então, bateu no novo piso de preços, a ansiedade tenderá a refluir. Na crise recente, há um incêndio a ser debelado, que é a fuga de dólares. O restante vem a reboque, e se administra.
Ocorre que o novo patamar dos juros não pode se sustentar por muito tempo, sob pena de lançar a economia em recessão feroz. A exemplo de 1995, dá-se a paulada de juros no momento em que há sinais de forte aumento da inadimplência por todo o país.
Passado o clima de "fogo no cinema", a redução dos juros vai depender essencialmente da capacidade de o país convencer os investidores de que terá condições de superar o desafio das transações correntes. Em outras palavras: que terá condições de ampliar substancialmente suas exportações, rompendo o nó górdio dos déficits comerciais.
Essa é a batalha de Waterloo da economia brasileira.
Novos tempos
Ao contrário das crises da primeira e da segunda metades dos anos 80, desta vez há um contingente apreciável de fatores e valores a serem mobilizados nessa direção, porque o país amadureceu nesse período.
No setor público, alguns fatores já estão mobilizados, mas a um ritmo lento. Outros estão disponíveis, mas não utilizados. Há uma infinidade de novas regiões e setores que poderão, em pouco tempo, integrar-se ao esforço exportador.
O exemplo de Birigui mostra que a coordenação de energias setoriais -sem depender de governo e sem esse nhenhenhém presidencial de ficar aguardando as reformas constitucionais- permite rápidos resultados no front exportador.
Basta a montagem de um plano de mobilização nacional pelas exportações, comandado pessoalmente pelo próprio presidente da República, que trate de coordenar e estimular os diversos agentes desse jogo.
Tripé de coordenação
Esse plano precisa se basear em um tripé:
1) Consolidação de novos paradigmas.
Uma das duas inovações mais importantes (e pouco perceptíveis) do atual governo foi a formação de um núcleo de inteligência na área econômica, visando tão-somente discutir e definir os novos paradigmas e valores da economia, e o papel das instituições envolvidas no processo -missão desempenhada pelo secretário de Política Econômica, José Roberto Mendonça de Barros.
São esses valores que permitem a um conjunto amplo e disperso de energias caminhar numa mesma direção, mesmo sem uma articulação central. Cada agente fica sabendo qual o seu papel, e passa a tocar de ouvido, sem precisar aguardar as ordens.
O problema é que tem pouca equipe para muita definição a ser feita. Pode-se aumentar a eficiência, a partir do momento em que a Secretaria de Política Econômica ampliar a formação de grupos externos ao governo, que ajudem a trazer subsídios para a discussão.
2) Gestão de processo.
Tendo as idéias, tem que se ter formas de acompanhar as ações dos diversos agentes envolvidos no esforço exportador.
O programa "Brasil em Ação" reinaugurou na administração pública a gestão de processo, ou seja, sistemas de planejamento e acompanhamento de ações de diversos agentes, amplamente utilizada pela Petrobrás e Eletrobrás até o início dos anos 80. A Casa Civil tem buscado princípios de qualidade total para fortalecer seus esquemas de monitoramento. Essa técnica é fundamental para coordenar ações de diversos agentes, evitando a dispersão.
3) Presidência da República.
A batalha não será vencida sem a participação direta do presidente da República. Compete a ele ser o maior propagador dos novos conceitos, pressionar todos os setores da administração que ainda não se imbuíram do sentimento de urgência, estimular os que derem conta do recado, montar pactos com entidades empresariais, difundir as vitórias conquistadas, em suma, disseminar novamente a mística do comércio externo.
Napoleão vencia não apenas por que tinha bom plano estratégico. Mas porque conhecia a alma do seu soldado e se envolvia diretamente com as ações.
Novos agentes
O papel do governo é esse: ser um núcleo de inteligência, organizar e estimular os agentes econômicos. Na base, há a necessidade da montagem de um amplo sistema de informações -com o concurso de prefeituras e federações empresariais- que permita identificar setores com potencial exportador.
Depois, é mostrar a partitura, e esperar que cada músico dê conta do recado.

E-mail: lnassif@uol.com.br

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