São Paulo, domingo, 2 de novembro de 1997
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A centelha que detona gestos suicidas

ALBERTO HELENA JR.
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

O close de Edmundo na TV, saindo de campo, expulso por ter dado uma cotovelada no goleiro do River Plate, seria um prato cheio para Lombroso, autor de esdrúxula teoria que pretendia identificar criminosos por traços fisionômicos, não tivesse sido o próprio Lombroso prato cheio para a psiquiatria moderna: olhos que se aproximam e espiam o vazio, como se não houvesse por trás deles nenhuma emoção, a fronte estreita e a ausência de lóbulos nas orelhas.
Daria um doce pra quem me dissesse onde nasce essa traiçoeira centelha que detona tais gestos suicidas, tão recorrentes na vida desse moço.
Até então, Edmundo vivia em lua-de-mel com a bola e a vida. Diziam que era porque, afinal, decidira submeter-se a um tratamento psicológico.
Artilheiro do Brasil, unanimidade nacional, carregava, com seus dribles e gols, o Vasco no topo da tabela. O próprio jogo com o River, pela Supercopa, decisivo, apesar do 1 a 0 para os argentinos, corria-lhe a gosto. A torcida aplaudindo a cada lance, e o Vasco a um passo do empate e da virada inevitável, quando, sem mais aquela, explode a proverbial irracionalidade do craque.
Pouco antes, fizera uma fieira de quatro inimigos, que terminou em falta à entrada da área. E, na jogada fatal, havia atraído o goleiro para fora da área. Sofreu um assédio faltoso, é verdade. Mas nada que justificasse violenta reação.
Por isso tudo, inclino-me a aceitar a tese dos que afirmam que, no fundo, Edmundo não agride nem os adversários nem o mundo. A cada soco, tapa, cotovelada ou pontapé desleal, Edmundo está mesmo é agredindo a Providência, que o ungiu com aquele endiabrado futebol de anjo.
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Janio de Freitas -que me perdoem os demais, o maior jornalista do Brasil-, em sua coluna, outro dia, advertiu para o cambalacho que se está armando à sombra da lei Pelé: liga pra cá, liga pra lá, e o próximo Brasileiro acabará dividido em A e B, para permitir que Corinthians, Fluminense, Cruzeiro, enfim, os ameaçados pelo descenso, voltem pelas portas dos fundos. A exemplo do que ocorreu por aqui, quando o São Paulo foi rebaixado, deram-lhe o atalho e o time disparou para o Mundial.
Aliás, Nabi Abi Chedid já havia anunciado que sentia cheiro de arroz queimado no ar quando da realização, em São Paulo, daquela reunião inócua sobre a lei Pelé. E Nabi é chef cinco estrelas na preparação dessa indigesta iguaria.
Eis por que, quando circulava por esta província -anos atrás- a tese de que a então CBD deveria ser transferida para Brasília, como expediente para afastá-la do domínio carioca, saltei de banda. Peralá! Antes, uma ou outra cariocada do que a queda definitiva nas profundezas da politicalha de Brasília. Esconjura!
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Ao mestre Cony, com todo respeito: no opúsculo intitulado "A Fonofonia na Música Popular Brasileira" (1933), Mário de Andrade presta significativa reverência ao talento de Noel Rosa. Elege o samba "Triste Cuíca", de parceria com Hervê Cordovil, como o melhor, sobretudo pela concepção moderníssima de sua letra.

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