São Paulo, segunda-feira, 3 de novembro de 1997
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Brasil dissemina exames gratuitos de DNA

MÁRIO MAGALHÃES
DA SUCURSAL DO RIO

Milhares de crianças brasileiras pobres vão passar a ter o direito de saber quem são seus pais.
Foram criados no Rio, em Minas Gerais e no Distrito Federal serviços gratuitos para exame de paternidade por análise do DNA (ácido desoxirribonucléico, que permite identificar o código genético).
Somando São Paulo, onde são oferecidos exames por HLA (compatibilidade de antígenos, substâncias que provocam a formação de anticorpos), 27,2 mil casos esperam nas filas do teste gratuito.
O Imesc (Instituto de Medicina Social e de Criminologia de São Paulo) montou laboratório que está pronto para entrar em operação.
Numa clínica de excelência privada, um caso simples, com análise do DNA do filho, da mãe e do suposto pai, custa até R$ 1.950,00.
A oferta pública enfrenta a resistência dos laboratórios particulares, que atuam num mercado que já movimenta R$ 6,5 milhões no Brasil. Até o fim do ano que vem, devem ser realizados 4.600 exames de DNA pelo serviço público em SP, RJ, MG e no DF, mais que os cerca de 4.200 feitos anualmente pelas clínicas privadas no país.
É pouco em relação à procura. "Só no Estado de São Paulo, há 5.000 novas investigações de paternidade a cada ano na Justiça", diz o perito João Lélio de Mattos Filho, que já atendeu cem comarcas no interior e mais de 15 varas de família.
Levantamento do IBGE (Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) em cartórios descobriu que uma a cada três ou quatro crianças nascidas no Brasil é filha de mãe solteira. Em 1990, foram 769 mil. Em 1992, 884 mil.
"Estudos mostram que a taxa mundial de não-paternidade oculta é de 5% a 10%", afirma o geneticista Sérgio Danilo Pena, referindo-se às pessoas que pensam ser seu pai o homem que não o é. Presidente do Gene (Núcleo de Genética Médica), de Belo Horizonte, e professor-titular da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), Pena foi o introdutor dos exames de DNA no país, em 88.
Os números atuais do país representam 2,5% dos 200 mil exames de paternidade por DNA realizados anualmente nos EUA.
Lá, a maioria dos testes é bancada, inicialmente, por Estados que têm motivações mais pragmáticas do que sociais. Como os Estados são os responsáveis por filhos de mães solteiras, têm interesse em transferir obrigações, como o pagamento de pensões, aos pais. O poder público banca o teste, identifica o pai e cobra dele o exame.
No Brasil, os serviços gratuitos acabam de ser implantados.
Desde setembro, a Faculdade de Medicina da UFMG faz exames de pessoas carentes encaminhadas pela Justiça. Em um ano, 2.400 casos serão analisados. A Secretaria Estadual de Saúde pagará R$ 960 mil, cerca de R$ 400,00 por conjunto de mãe, filho e suposto pai.
No Rio, a Defensoria Pública liberou R$ 500 mil para o laboratório de DNA da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) investigar aproximadamente 850 casos, com pagamento médio de R$ 585,00 por trio de amostras. O programa dirigido pelo biólogo Elizeu Carvalho começou em agosto.
No Distrito Federal, desde julho a Divisão de Pesquisa de DNA Forense da Polícia Civil faz 20 testes mensais gratuitos de paternidade. Em 98, serão 50 por mês. No DF, lei distrital obrigou a realização de exames grátis.
No Rio, lei aprovada na Assembléia foi vetada pelo governador Marcello Alencar (PSDB). O veto foi derrubado pelos parlamentares e a disputa acabou na Justiça, mas o convênio da Defensoria Pública tornou viável o programa.
Os juízes têm critérios diferentes para estabelecer quem é considerado pobre. No Rio, os casos encampados pela Defensoria Pública são os de mães que ganham até três salários mínimos (R$ 360).
Em São Paulo, um projeto de lei tramita na Assembléia Legislativa.

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