São Paulo, quarta-feira, 5 de novembro de 1997
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REDESCOBERTA DO BRASIL

A crise financeira, por penosa que seja, tem ao menos um mérito: ao colocar o governo em estado de alerta, cria uma excelente oportunidade para que o Executivo e o Congresso se empenhem de fato na reforma do Estado. Aliás, pode-se até mesmo dizer que a decisão do Executivo -em favor de uma rápida reabertura das negociações para ajustar as contas públicas- é em parte ditada pelas circunstâncias, mas é também um sinal de sensibilidade política.
O momento é economicamente ruim, mas é da adversidade que pode ressurgir o sentimento de urgência sem o qual dificilmente serão feitas mudanças de fôlego na estrutura do Estado. A agenda é conhecida e não pode sofrer adiamento.
A oportunidade é boa para que o governo, aliás, redescubra o Brasil. Há tempos, mesmo diante das turbulências nos mercados internacionais, dizia-se com ironia principalmente no mercado financeiro que o Brasil parecia uma Suíça. Pena que só agora o governo tenha tomado consciência aguda de que governar é preciso, em vez de apenas esperar Godot -no caso, as reformas.
Inflação e crescimento baixos, reservas elevadas e globalismo pareciam virtudes de Primeiro Mundo, ainda que existissem alertas sobre a necessidade de corrigir os desequilíbrios que se agravavam.
O governo ocupava-se de coisas distantes: na política, após a luta obcecada pelo direito à reeleição, as articulações voltaram-se para mudanças num segundo mandato; na economia, as providências eram cosméticas, setoriais ou protelatórias; na administração, tenderam à inércia. Faltava a prática cotidiana do governo; a crise tem o mérito de instigar o Planalto a sair do estado de torpor que é, a rigor, tropical e nada suíço.
Resta saber se, com o despertar das responsabilidades de governar -e, espera-se, de legislar-, não voltarão, também revigoradas, as resistências corporativas, burocráticas ou setoriais que vêm se aliando à tendência oficial à leniência.

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