São Paulo, quinta-feira, 6 de novembro de 1997
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Recolhimento de propina continua normalmente

ROGERIO SCHLEGEL
DA REPORTAGEM LOCAL

A Folha presenciou ontem a cobrança de propina por pessoa identificada como fiscal da Administração Regional da Sé, o que indica que o esquema de corrupção continua funcionando apesar das denúncias divulgadas ontem.
Por volta das 12h, um homem negro, de cabeça raspada e camisa azul, aparentando 30 anos, percorreu as ruas próximas à praça da Sé arrecadando a propina.
Camelô que se identificou apenas como João afirmou que ele é fiscal da regional. "Quando tem rapa, ele vem junto com os outros e ajuda a colocar a mercadoria no caminhão da prefeitura para levar embora", disse João.
O camelô disse saber o nome do fiscal, mas não quis revelá-lo.
O fiscal se aproximou da barraca de João e, sem pedir, pegou e abriu a pochete do ambulante que estava sobre o tabuleiro. Após revirá-la, reclamou da falta de dinheiro.
O camelô alegou que não tinha vendido nada naquela manhã, por isso não tinha como pagá-lo. O fiscal disse que voltaria mais tarde.
João afirmou à reportagem que não tinha quantia fixa semanal combinada com o fiscal, porque seu ponto era ruim. Ele disse que "negocia na hora" o valor dado como propina, conforme as vendas estejam "quentes ou caídas".
Outros camelôs ouvidos na região disseram que denúncias anteriores não abalaram o esquema montado pelos fiscais.
Segundo eles, o mais comum é que mesmo fiscais nominalmente citados em reportagens continuem trabalhando na área. Quando são substituídos, o novo fiscal dá continuidade ao esquema.
Na rua Barão de Itapetininga, apenas as barracas menores foram montadas na manhã de ontem. Por acordo com os fiscais, feito há cerca de dez dias, as maiores -conhecidas como quiosques- só se instalam a partir das 17h.
Santo Amaro
Na área do largo 13 de Maio, em Santo Amaro (zona sul da capital), camelôs informaram que as denúncias só fizeram os camelôs encarregados de recolher a propina pedir maior discrição aos demais.
Na região, o dinheiro é passado na sexta-feira a um camelô encarregado de repassá-lo aos fiscais, no sábado pela manhã.
Ontem, continuava de pé inclusive a cobrança de propina dos ambulantes instalados no camelódromo oficial, na praça Salim Farah Maluf. Embora a maioria esteja regularizada, todos pagam R$ 10 por semana aos fiscais da regional.
Segundo um camelô que não quis se identificar, os legalizados que não pagam têm suas mercadorias apreendidas pelos fiscais, sob alegação de que não têm nota.
Além de aumentar a discrição no momento do pagamento da propina, as denúncias também fizeram cair o preço de venda dos boxes do camelódromo oficial.
Até anteontem, um box bem localizado estava cotado em R$ 1.500. Ontem, já era possível encontrá-lo por R$ 1.300, oferecido por camelô não identificado que "não quer mais amolação".

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