São Paulo, sexta-feira, 7 de novembro de 1997
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Tigres e dragões

JOSÉ SARNEY

O furacão passou? Com um sorriso irônico os investidores interessados na normalidade dizem que sim, mas no fundo dizem que não. Uns afirmam que a Bolsa não significa nada, que nada tem a ver com a economia. A verdade é que, no mundo moderno, mais do que nunca, a Bolsa passou a ser o termômetro do capitalismo. Ela é o lado visível da saúde financeira e da prosperidade.
Parece haver uma lei sobre o funcionamento das Bolsas. O certo é que há períodos críticos de crise. Em 1929, houve o grande crack, que até hoje é referência e memória do terror. Desabou a economia americana que, por sua vez, levou a economia mundial. Em 1987, igualmente, a Bolsa de Nova York desabou de maneira trágica. A economia americana entrou em crise. Podemos concluir que, de tempos em tempos, a Bolsa tende a passar por períodos de ajustamento. Por outro lado, antigamente, se a crise era nos Estados Unidos, ela tendia a propagar-se. Hoje, muito mais do que ontem, com o mercado financeiro globalizado, crise em qualquer lugar é crise no mundo inteiro.
Nunca é demais repetir que é impossível, porque fictício, um mercado de papéis ser 20 vezes superior à economia real e ter um crescimento constante. O sr. Greenspan, que adquiriu o título de profeta das Bolsas, qualificou essa ciranda de exuberância irracional para reafirmar, sete meses depois, que existia um otimismo excessivo em relação à economia. Não é preciso dizer que a Bolsa de Nova York caiu no dia seguinte. Diante das expectativas de falta de confiança, ele corrigiu dizendo "as ações não estão supervalorizadas sempre que os lucros da empresa estejam à altura das expectativas".
Agora, Greenspan advertiu que "a queda foi salutar" e necessária para trazer o mercado à realidade. No Brasil, acho que acabamos com a história de que aqui é diferente e nada nos atinge. Se estamos na economia global, dela não podemos fugir. Não adianta construir teorias conspiratórias de que houve intenção de especular sobre o Brasil. O Brasil não pode estar fora. Nossa liquidez fez com que os investidores de outros mercados procurassem fazer logo a liquidação de seus papéis aqui para cobrir outras áreas. Por outro lado, enquanto o país não equilibrar o seu déficit público, hoje da ordem de 5% do PIB, e não reverter a tendência da balança comercial, ficará dependente do capital especulativo, isto é, dos investidores de curto prazo, esses que vivem pulando de um lugar para outro, pois eles terão de abastecer, no mínimo, o mercado brasileiro com US$ 3 bilhões mensais (!), necessários para cobrir o déficit. Isto, também, nos faz cair na armadilha dos juros altos, pois são eles que seguram os especuladores.
Por outro lado, os técnicos que se debruçaram sobre a última crise são unânimes em apontar o perigo da inundação do mercado por "frenéticas privatizações de papéis", na expressão do New York Times. A advertência está aí. Que a lição seja aprendida. Não temos só o dragão da inflação, temos outros dragões e tigres...

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