São Paulo, sábado, 8 de novembro de 1997
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Crianças dizem que não voltam para USP

MARCELO OLIVEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Na opinião de crianças e adolescentes da favela São Remo ouvidos ontem pela Folha, a USP não é mais uma opção de lazer, hoje reduzido ao campo de futebol, ao circo escola (que se encontra fechado) e aos bailes de salão e festas de aniversário nos fins-de-semana nas vielas da favela.
José Eduardo Placidino Pereira, 13, que ontem jogava futebol no campo de terra da favela, já nadou na raia da USP, onde foi encontrado morto o adolescente Daniel Pereira de Araújo, 14.
"Depois do que aconteceu com o Daniel, estou com medo", diz.
"Estamos revoltados com o que aconteceu com o Daniel. Foi sacanagem", diz Pedro de Oliveira Bezerra da Silva, 12, que nem sequer sabe onde fica a raia olímpica.
João Paulo dos Santos, 12, e seu irmão Willian Alexandre dos Santos, 9, contam que antes do que aconteceu com Daniel jogavam bola, corriam e andavam de bicicleta na USP.
"Agora estamos com medo e os seguranças não deixam mais entrar no domingo. Só estamos indo nos finais de semana."
Segundo João Paulo e os demais garotos que brincavam no campo de futebol e olhavam para os destroços da depredação que ocorreu anteontem na USP, a primeira imagem que eles têm em mente quando o assunto é segurança da USP é "medo."
Folgados
"Eles são uns folgados", diz João Paulo. "Um deles mandou a gente abaixar as calças. Tivemos (ele e João Paulo) de mostrar a bunda para ele bater."
Segundo Jones Silva de Oliveira, 11, oito garotos jogavam bola no relógio da USP quando os seguranças abordaram o grupo.
"Ele chegou a tirar o cinto para bater na gente, mas desistiu quando uns garotos que passavam de bicicleta viram o que ele estava fazendo."
Segundo José Eduardo, ao desistir de agredir os garotos, o segurança mandou eles saírem correndo.
"Tão cedo nós não vamos na USP. Só quem trabalha lá é que vai", diz Jones.
Muro
A adolescente Roselita Pereira, 16, conta que o lazer dos favelados mudou radicalmente após a USP erguer, há dois anos, o muro que separa a favela da universidade.
"Antigamente a USP era legal. Dava para passear de bicicleta no bosque. Agora puseram o portão e o muro e perdeu a graça porque a vigilância aumentou."
Roselita diz que não visita a USP há tempo. "Não dá mais."
Ela conta que hoje prefere os bailinhos no salão do bairro e as festas de aniversário. Ela torce pela reabertura do circo escola.

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