São Paulo, domingo, 9 de novembro de 1997
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Controle remoto

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
EDITOR DE DOMINGO

As pessoas querem controle sobre a TV. Mais: querem que esse controle seja prévio, que os programas sejam vistos e autorizados por alguma instância antes de irem ao ar. A maioria acredita que a própria empresa e a sociedade podem executar a tarefa, mas 20% gostariam que o governo fosse o responsável.
É essa, ao menos, a opinião dos paulistanos, segundo pesquisa publicada hoje no TV Folha.
É compreensível que os espectadores queiram interferir na programação e que desejem algumas garantias sobre o tipo de coisa que vai chegar pelo vídeo às suas salas. A TV é um veículo muito especial. Ela está na casa, organiza o cotidiano da família, é o primeiro entretenimento, senão o único, de milhões de brasileiros e serve, ainda, de babá eletrônica para sabe-se lá quantas crianças sem outras alternativas.
A TV tem um papel estruturador no país, sociedade iletrada e ignorante, sem educação e sem referências. O brasileiro é cada vez mais socializado pela TV. Começa babando com a Xuxa e acaba babando com o "Jornal Nacional". É a TV que ensina o que pensar, o que dizer, o que vestir, o que gostar. É ela, também, que decide, quem vai governar.
Tudo isso dificulta o argumento liberal, segundo o qual o mercado decide, o espectador é livre para trocar de canal ou desligar o aparelho. É como dizer que as pessoas são livres para andar ou não de ônibus em São Paulo. O critério liberal para aferir se o público aprova ou não a TV ou se sua função social está sendo cumprida é um sofisma. Rico vai de carro e não tem TV, tem "home theater". É evidente que um veículo com esse peso poderia e deveria cumprir um papel menos degradante e estúpido. Não um papel "educacional", no sentido estrito ou chato do termo -mas um papel, ao menos, mais inteligente, mais criativo, mais interessante, mais estimulante.
A questão, no entanto, é saber se "controles sociais", como quer a deputada Marta Suplicy, vão resolver ou agravar o problema. A esquerda e a direita adoram controles. E a julgar pela pesquisa, a opinião pública também.
Esquerda e direita estão sempre unidas, embora separadas, quando se trata de controlar e de defender valores. Considerando a história do país, os riscos são enormes. Pode-se juntar o dirigismo com o desejo de ser dirigido. O problema é menos da TV e mais do país. A questão é de ordem política e econômica. O Brasil concentra renda e sonega educação. Resta às massas o biscoito indigesto dos Gugus e Ratinhos.

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