São Paulo, domingo, 9 de novembro de 1997
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Usuários aderem à troca de seringa

'Se a agulha entope, você vai querer outra na hora'

AURELIANO BIANCARELLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Renato tem 32 anos, um filho de 2 e usa cocaína injetável desde os 15. Já foi um dos "agentes da rede" no programa de troca de seringas que a Apta desenvolve em bairros de São Paulo.
Hoje, desempregado, ele continua levando suas seringas usadas para trocar com kits novos quase todas as quartas-feiras.
"Se a sua agulha entope ou fica rombuda, você vai querer outra na hora. Se não tem uma nova, vai usar a do companheiro mesmo. Tento fazer a cabeça da moçada, mas nem sempre funciona."
Uma seringa, pelas suas contas, dá para uns quatro "baques". Cinco gramas de cocaína, que custam de R$ 50 a R$ 70, podem garantir "umas três horas de balada" para um grupinho de três ou quatro.
Renato (o nome é fictício) tem o vírus do HIV e diz ter se infectado em 1989. "Me lembro daquela noite. Fiquei muito louco, as luzes estavam apagadas e eu peguei uma seringa qualquer." A companheira com quem vive também tem Aids, "pegou do antigo companheiro".
Renato calcula que conhece uns 90 rapazes e moças que se picam. "Metade não tem Aids. Todo mundo poderia ser salvo se não caísse na loucura e não misturasse seringas. Mas ainda tem gente que não acredita que a Aids existe."
Juliano, 25, usa cocaína injetável desde os 17. Garante que só divide a seringa com a mulher. Na quarta-feira, ele estava entre os que vieram trazer seringas usadas e levar novas. "Sou metódico", ele afirma. "Nem quando bate a fissura eu tomo no grupo. E quando acho que é hora de parar, eu paro."
O número de dependentes de droga injetável caiu desde que a Apta iniciou o programa de trocas, no ano passado. Renato acha que é por causa do crack, mais barato, e do medo da Aids. "Crack você acha em qualquer esquina, custa menos e dá um 'tuim' parecido." "Tuim" é descrito como a sensação provocada pela droga no momento em que atinge o cérebro.

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