São Paulo, domingo, 9 de novembro de 1997
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Fundos de pensão podem agravar instabilidade

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

O surgimento de gigantescos fundos de pensão, seguradoras e outras instituições com obrigações de longo prazo criou o mito de que tais "investidores institucionais" estabilizariam os mercados. Agora é uma boa hora para rever o mito.
Tendo horizontes de tempo mais longos, em tese esses agentes seriam capazes de enxergar mais longe, evitando ou até contribuindo para reduzir a instabilidade especulativa de curto prazo.
Maria Cristina Penido de Freitas, do Instituto de Economia do Setor Público, defendeu há pouco mais de seis meses seu doutorado em Paris, que decifra o mito dos investidores institucionais. Ela analisa as tendências da concorrência bancária e faz "uma leitura heterodoxa da evolução recente do sistema financeiro internacional".
Os fundos de pensão aparecem entre os novos atores dos mercados financeiros, concorrendo com os bancos. Aí começam os problemas: a própria extensão de suas atividades é desconhecida, pois não estão sujeitas às tradicionais regulamentações que recaem sobre as instituições bancárias.
Os bancos centrais enfrentam dificuldades inéditas quando os ciclos de crédito são determinados por bancos de investimento, companhias de crédito hipotecário, de seguros e instituições financeiras ligadas às grandes empresas.
Há exemplos no Brasil. Na semana passada, por exemplo, quando o governo anunciou a elevação dos juros, logo os jornais noticiaram que alguns bancos "de montadoras" continuavam dando crédito às taxas antigas.
Parece ousadia e, aliás, foi uma decisão que seduziu muitos clientes, que subitamente parecem ter começado a acreditar que era uma boa oportunidade comprar carros a prazo por juros apenas escorchantes e não estratosféricos.
Na prática, a consequência dessa ilusão de negócio da China pode ser uma elevação da inadimplência, cujos efeitos são conhecidos. Haveria depois um "Proer" especialmente para as montadoras?
Longo prazo fictício
Os fundos de pensão, entretanto, são o exemplo mais acabado de investidor institucional que muda o caráter da concorrência entre os agentes financeiros. E vários analistas acreditam que essas entidades voltadas para as áreas de seguros de saúde, aposentadoria etc. associam-se naturalmente a um horizonte de longo prazo.
Freitas alerta para uma ilusão: o que parece "financiamento de longo prazo" está muitas vezes vinculado a fórmulas sofisticadas de refinanciamento de dívidas que na verdade são de curto prazo.
Ou seja, há uma suposta previsibilidade e um horizonte temporal de longo prazo nas obrigações assumidas pelos investidores institucionais junto a seus clientes. Mas isso não garante que os recursos acumulados por tais instituições sejam necessariamente investidos em ativos de longo prazo.
Ao contrário do que esperavam os economistas ortodoxos, o crescimento dos fundos de pensão e congêneres não levou a um alongamento dos prazos dos investimentos, não diminuiu a volatilidade dos mercados nem promoveu uma distribuição eficaz dos capitais nas economias.
A pergunta heterodoxa torna-se então inevitável: há um papel para o Estado na regulamentação dessas novas entidades que na prática também são especulativas?

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