São Paulo, segunda-feira, 17 de novembro de 1997
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Ecoturismo causa danos ao Pantanal

RUBENS VALENTE
DA AGÊNCIA FOLHA, EM PASSO DO LONTRA (MS)

Duas pesquisas divulgadas semana passada pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) revelam os riscos que o ecoturismo descontrolado está levando ao Pantanal.
Maior planície alagável do mundo, localizada nos Estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, o Pantanal atrai cerca de 100 mil visitantes por ano.
As pesquisas, feitas com apoio da Base de Estudos do Pantanal da UFMS, em Passo do Lontra (300 km de Campo Grande), levantam indícios de que essa atração já se tornou um perigo para os diversos e frágeis ecossistemas que compõem a região.
Na rodovia BR-262, a Transpantaneira, o biólogo Wagner Fischer, 27, como parte de uma tese de mestrado, identificou 1.310 animais mortos por atropelamento no último ano e meio.
Entre os mortos, há exemplares de cinco espécies que, segundo o Ibama, estão em vias de extinção: onça-pintada (2), tamanduá-bandeira (88), lobo-guará (5), lontra (4) e cervo-do-pantanal (2).
Há apenas uma placa indicando travessia de animais em todo o trecho pesquisado da rodovia, de 420 km. Os animais cruzam a pista em busca de alimentos e água.
Pela rodovia, principal ligação entre Campo Grande e Corumbá, passam por dia cerca de 1.700 veículos. O fluxo vem crescendo na ordem de cem veículos por dia todo ano, desde 92, em razão do turismo e do início do gasoduto Bolívia-Brasil, obra da Petrobrás que cortará 70 km do Pantanal.
A rodovia foi construída na década de 80, parte pelo governo militar e parte pelo Dersul (Departamento de Estradas de Rodagem do Mato Grosso do Sul). O projeto não deixou alternativas para a fauna atravessar a pista, segundo o pesquisador Fischer.
O turismo descontrolado pode ter sido a causa do abandono, no mês passado, de um grande ninhal (área de reprodução coletiva de pássaros) às margens do rio Vermelho. Em 1995, o local chegou a abrigar cerca de 10 mil aves.
Pesquisadores da UFMS e do Cenave (Centro de Pesquisa para a Conservação dos Animais Silvestres), do Ibama de Brasília, estudavam o ninhal desde 1991, para colher dados biológicos das aves e traçar possíveis rotas de migração.
Todo ano, a partir de agosto, as aves formavam o ninhal do rio Vermelho (são dezenas de ninhais em todo o Pantanal), em uma área de cerca de 60 hectares.
O local era procurado por garças brancas e cinzas, colhereiros, cabeças secas e savacus. Nos anos de 94 e 96, o ninhal não se formou, por cheia excessiva e falta de alimentos, respectivamente.
Em agosto, os pesquisadores observaram que as aves começavam a preparar os ninhos. As condições, segundo o professor de Zoologia Masao Uetanabaro, 47, eram propícias para a reprodução.
Como cada ave põe em média três ovos, 15 mil filhotes poderiam nascer até outubro -sem levar em conta as perdas ocasionadas pelo ataque de predadores, como o gavião-carcará, e por causas naturais, como fogo e vento.
A concentração das milhares de aves proporcionava um espetáculo visual e sonoro, mas muitos turistas queriam vê-las em revoada, para fazer fotografias e filmagens.
Há "fortes indícios", segundo o pesquisador Uetanabaro, de que barulhos feitos por turistas, a fim de propiciar essas imagens, tenham sido a principal causa do abandono do ninhal.
Segundo ele, as aves têm visão aguçada e, ao menor sinal de aproximação, principalmente se as pessoas estiverem com roupas de cores berrantes, podem se assustar e abandonar o ninho.

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