São Paulo, segunda-feira, 17 de novembro de 1997
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Na torre de marfim

HELCIO EMERICH

É uma definição simples, para não dizer simplória. Mas no fundo no fundo, marketing não é nada mais do que satisfazer as necessidades dos consumidores com bons produtos ou bons serviços e ganhar dinheiro com isso. O problema é que entre o conceito despojado e a realidade dos negócios vai uma grande diferença. Para começar, se você pretende mesmo atender aos desejos dos seus públicos-alvo e entregar-lhes os produtos que eles querem, sua empresa precisa estar preparada para detectar as mudanças dessas expectativas e para introduzir inovações nos seus produtos ou fazer novos lançamentos antes que a concorrência o faça. A indústria automobilística norte-americana pensou durante duas décadas que poderia continuar empurrando nos consumidores veículos que eles não desejavam. E só descobriu que precisava mudar suas linhas de produtos depois que as montadoras japonesas haviam tomado 30% do mercado dos Estados Unidos. Se a GM e a Ford, assim como a Sears e a IBM, sofreram golpes pesados cujos efeitos custaram milhões de dólares, foi porque os consumidores haviam mudado e elas não.
Novas companhias como Honda, Toyota, Wal-Mart, Dell e Microsoft chegaram ao negócio já sintonizadas com essas transformações e se instalaram nos mercados que as outras marcas haviam construído.
A ironia da história é que muitas empresas, que de uma hora para outra escancaram suas vulnerabilidades criando oportunidades para as ofensivas de concorrentes mais ágeis, são, na maioria, as mesmas que alcançaram sucesso e liderança à base de poderosas estratégias conduzidas por marqueteiros e "boards" supostamente bem informados. Não raramente, esses "experts" resolvem ignorar os fluxos de informações do mercado para seguir seu próprio caminho, enquanto os consumidores seguem outro.
No momento em que os problemas afloram, eles são examinados nos mais altos escalões da companhia e não lá fora, no mercado, onde se dá o encontro entre os produtos e os consumidores. Às vezes caras consultorias são contratadas e, quando seus diagnósticos ficam prontos, são analisados por um comitê que prepara seu próprio relatório à diretoria e a tarefa de todos é considerada encerrada. Um analista de negócios dos Estados Unidos, John Cuniff, observou que os principais gurus do marketing automobilístico não sabiam nem sequer trocar a vela de um motor.
Já uma montadora japonesa colocou certa vez todos os seus burocratas na rua para vender automóveis de porta em porta, de forma que eles pudessem pelo menos ter algum contato pessoal com os consumidores. Cada vez mais sofisticados, cada vez mais afastados do consumidor, os marqueteiros parecem condenados a venerar a complicação e abominar a simplicidade.

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