São Paulo, segunda-feira, 17 de novembro de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

"Outono Chabrol" redime patinho feio da nouvelle vague

AMIR LABAKI
ENVIADO ESPECIAL A PARIS

Foi preciso Claude Chabrol chegar ao seu 50º filme para a França finalmente se curvar ao patinho feio da nouvelle vague.
O lançamento de "Rien Ne Va Plus" (Nada Funciona) catalisou a maior homenagem já prestada ao mais prolífico e subestimado contemporâneo de Godard, Truffaut e companhia. É o chamado "outono Chabrol" na França.
A mítica revista "Cahiers du Cinema", em cujas páginas Chabrol debutou como crítico, acaba de lançar um número integralmente dedicado ao cineasta. Os destaques são uma extensa entrevista com Chabrol revelando-se de A a Z e depoimentos de parceiros constantes como Stéphane Audran, Isabelle Huppert, Michel Bouquet e o produtor Marin Karmitz.
Extensa retrospectiva ocupa o cinema Le Champo. Na marquise, bilhete ampliado de Chabrol retribui: "Le Champo foi minha segunda universidade". Outra mostra acontece até 20 de dezembro no Instituto Lumière de Lyon. As homenagens prosseguem em Florença (Itália) e Telassonique (Grécia).
À primeira vista, "Rien Ne Va Plus" parece um Chabrol modesto para tanta festa. Trata-se de uma comédia policial assumidamente cínica, que venceu no mês passado o festival de San Sebastian.
Isabelle Huppert volta a encarnar a anti-heroína chabroliana típica. Desta vez, forma com Michel Serrault divertida dupla de golpistas especializada em roubar homens de negócios em viagem. O "modus operandi" dos escroques revela-se na sequência de abertura.
Elegantemente disfarçados, Betty (Huppert) e Victor (Serrault) atacam num cassino. Ela seduz e dopa um comerciante. Sua carteira é aliviada em exatos 43%- a taxa máxima de impostos na França.
Tudo vai bem, com a dupla deixando a base parisiense para cruzar a França num trailer, quando o amor, claro, detona a crise. Betty se apaixona por Maurice (François Cluzet), escroque de maiores pretensões que se faz passar por banqueiro suíço, mas que trabalha para uma máfia internacional.
Por trás dessa farsa amoral, Chabrol encena sutil metáfora da representação no cinema. Betty, Victor e Maurice divertem-se ganhando a vida como atores-roteiristas de filmes sem câmera.
Não é à toa que ele classifica "Rien Ne Va Plus" como autobiográfico. Para ele, o prazer de viver é o prazer de filmar, que aqui se assume como prazer de iludir. Nessa síntese, o novo Chabrol justifica a celebração que motivou.

Texto Anterior: Cineasta encerra 'ciclo da indignação'
Próximo Texto: Serrault interpreta ladrão
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.