São Paulo, quarta-feira, 19 de novembro de 1997 |
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O RETIRO DO FUTEBOL
ARNALDO RIBEIRO; LUIZ CESAR PIMENTEL; PAULO COBOS
Atibaia (65 km ao norte de São Paulo) abrigou só neste ano dez das principais equipes do país: Palmeiras, Corinthians, Santos, Bahia, Fluminense, Criciúma, Goiás, Atlético-PR, Grêmio e União. O clima temperado e seco e o "segundo melhor ar do mundo", segundo a Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura), são os grandes atrativos da região. Em qualidade de ar, Atibaia, ou manancial de água saudável, em tupi-guarani, só perde para a Suíça. Cada vez mais invadida por jogadores e pelos turistas nos finais de semana, ela consagrou o apelido de "cidade-dormitório". O histórico de encanto de Atibaia aos times teve sua origem em 1990, quando o Bragantino, da vizinha Bragança Paulista, decidiria passagem às finais do Paulista. Seu técnico à época, Wanderley Luxemburgo, procurou afastar os jogadores do clima de empolgação que dominou a cidade. Na arquibancada do time, conversava com o espiritualista Robério de Ogum, seu conselheiro, e sugeriu Atibaia. Robério aprovou na hora. "O astral na cidade é fantástico, sensacional", diz. O time de Luxemburgo foi campeão paulista e o técnico não abre mão de hospedar os times que treina na cidade. Foi assim com Palmeiras e Santos. "O Wanderley está revolucionando. Ele é um líder e todos procuram seguir os passos dos vencedores. Essa é uma corrente que foi se formando", diz Robério. Outra tradição adotada por Luxemburgo na cidade é hospedar-se no quarto 171 do Park Hotel Atibaia. O hotel é o reduto preferido dos futebolistas. O gerente, o palmeirense Vittorio Manzoli, 39, tem uma coleção de mais de 70 camisetas de times que se hospedaram lá. Entre as camisas, algumas "relíquias", como a número 17 da seleção brasileira, que o meia Mazinho usou na Copa dos EUA e pediu para todos os jogadores autografarem, e uma do Kashiwa (Japão). Ele só não guarda os presentes de corintianos e são-paulinos. Não tem também boas lembranças do Ituano, que, segundo ele, não pagou a conta dos jogadores no primeiro semestre deste ano. Segundo Manzoli, seu hotel é "pé-quente". "Todo time que veio aqui conseguiu ser campeão." Em pré-temporadas, os times usam em média 25 apartamentos do hotel. A diária usual é de R$ 180,00 por habitação. Para as equipes, o preço cai para R$ 150,00. Outro hotel da região que hospeda times de futebol é o Eldorado Village, que recebe atualmente o Cruzeiro. A equipe se prepara para decidir o Mundial interclubes contra o Borussia Dortmund, em dezembro, no Japão. O técnico do time, Nelsinho Batista, justifica a escolha. "Além de o ar ser puro, e o clima, tranquilo, em Atibaia temos uma convivência de 24 horas com o grupo", diz. O lateral-direito Vítor, que afirma já ter estado em Atibaia "mais de 30 vezes", quando jogava no Corinthians e São Paulo, endossa a palavra do técnico. "Aqui é o melhor lugar onde já me concentrei." Melhores campos O principal campo de treino hoje na cidade é o do Centro Esportivo Educacional Nakazawa, que, além de servir aos clubes de passagem pela cidade, funciona como escola para jovens japoneses aprenderem a jogar futebol. Com uma área total de 484 mil m2 e com 25 funcionários em dedicação integral, o centro abriga a cada ano 30 japoneses, que estudam em escolas de Atibaia pela manhã e treinam todas as tardes. A comunicação com a família no Japão é o grande passatempo. Por dia, são enviadas e recebidas cerca de 40 cartas e encomendas. Os telefonemas são praticamente diários, feitos por meio de um cartão especial, de uma empresa japonesa. Ele só permite ligações para a casa dos pais dos garotos, com um limite máximo preestabelecido pela própria família. Os projetos do Centro Nazakawa não se resumem aos japoneses. Aproveitando o fato de Atibaia não ter um time profissional, o centro pretende no futuro formar um, nos moldes do Matsubara-PR, time que mantém convênios com equipes japonesas. O Centro Nakazawa está construindo mais um campo de treino e quer equipar um deles com uma arquibancada para 20 mil pessoas. Atibaia tem diversos pontos turísticos, como a Pedra Grande, que serve de base para os praticantes de vôo livre, e a famosa festa das flores e dos morangos. Os jogadores, porém, não usufruem, preferindo ficar nos hotéis, nos arredores da cidade. São poucos os que arriscam um passeio. Um dos pontos visitados é a loja de discos e instrumentos musicais Real, no centro. Por ela, já passaram o goleiro Ronaldo, do Corinthians, e, mais recentemente, Viola, Roque Júnior e Rogério, do Palmeiras. Lá, Ronaldo comprou uma guitarra e um amplificador. "E deu certo. Agora sou eu quem vende discos da banda dele aqui (Ronaldo e os Impedidos)", diz o dono da loja, Nereu Silveira. Os jogadores do Palmeiras preferem outro estilo musical, pois compraram instrumentos de percussão -tamborins e pandeiros. Pouco caso A presença de equipes e atletas famosos contagiou os atibaienses, mas não seduziu os administradores da cidade. O programa de esporte consome menos de 2% do orçamento do município. Segundo o diretor da Secretaria de Esportes e Lazer, José Fernando Ferro, os esportes prioritários são o vôlei e o futebol. Não existe projeto para a ressurreição do Grêmio Atibaiense -time profissional que disputava a terceira divisão e foi desativado há mais de cinco anos- apenas para a construção de mais um ginásio. "Entrar em campeonato de futebol por entrar, sem estrutura e apoio de empresas, está fora dos nossos planos", disse Ferro. Mais de 30 equipes, porém, disputam o campeonato amador. Ferro confirma o crescente interesse da população pelo esporte, principalmente das crianças. Segundo ele, após as passagens dos clubes pela cidade, nota-se um aumento expressivo de adeptos. "Desde que os times começaram a vir para cá, o interesse das crianças pelo futebol cresceu uns 40% e foram criadas mais cinco escolinhas de futebol." Texto Anterior: Paula desiste de ir para a WNBA em 98 Índice |
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