São Paulo, domingo, 23 de novembro de 1997
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Padres fazem parte de 'grupo de risco'

LUIS HENRIQUE AMARAL
DO ENVIADO ESPECIAL

O médico Artur Guerra de Andrade, coordenador do Grea (Grupo de Estudos sobre Alcoolismo e Drogas) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, afirma que os padres, assim como os lixeiros, os jornalistas e os funcionários de IMLs (Instituto Médico Legal), fazem parte do "grupo de risco" do alcoolismo.
"Na população normal, os estudos mais otimistas afirmam que o índice de alcoolismo é de 10%. Nos grupos de risco, essa média atinge facilmente 15%", diz o médico, especialista no tratamento de dependentes químicos.
Guerra vê nos padres algumas das características que induzem ao vício do álcool. "Eles têm muito contato com o álcool, em todas as missas, e também carregam as angústias do pecado", diz.
Os "facilitadores" mais comuns do alcoolismo, segundo o médico, são quatro. O primeiro é uma pré-disposição do organismo ao álcool. "A pessoa tem de se sentir bem com a bebida, gostar do gosto e do cheiro. Nem todo organismo tem essa característica", explica.
O segundo fator é a frequência com que o álcool é consumido. Quanto mais constante, maior é a chance de se criar a dependência.
Ainda colabora para o vício o que o médico chama de "facilitação social". Algumas pessoas podem beber sem controle de amigos ou família. "Quem trabalha na rua, como o lixeiro, pode beber sem controle, ao contrário de funcionários de escritórios que são vigiados pelos colegas", diz Guerra.
Ainda entre esses facilitadores, estão as pressões psicológicas características de determinadas profissões. "Os jornalistas, por exemplo, têm de ficar atentos a diversas fontes de informação, que chegam por entrevista, fax e telefone. Além disso, são pressionados pelos horários rígidos de fechamento das edições. Depois do trabalho, muitos bebem para relaxar", diz.
O mesmo problema afeta os funcionários de IMLs, que têm de atender parentes de pessoas mortas e enfrentam muitas situações estressantes.
A oferta do álcool é o quarto "facilitador". Algumas pessoas estão mais expostas à bebida que outras.
Os padres, pelas características de sua profissão, sofrem de quase todos os "facilitadores".
O vinho da missa é uma constante na vida dos padres. Eles vivem sozinhos e podem beber à noite sem controle. Além disso, o celibato e todas as responsabilidades de cuidar do atendimento espiritual de uma paróquia, que muita vezes se transformam em problemas terrenos, facilitam o vício.
Para Guerra, o tratamento pelo método dos Alcoólatras Anônimos é eficiente. "Mas só 20% das pessoas que eu envio para lá se adaptam". Segundo ele, a única forma de melhorar "é nunca mais beber álcool na vida".
(LHA)

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