São Paulo, domingo, 23 de novembro de 1997
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Israel deve romper solidão desafiadora

ABBA EBAN
ESPECIAL PARA O "HAARETZ"

Yitzhak Rabin (primeiro-ministro israelense assassinado há dois anos) vem sendo intensamente reverenciado em Israel, mas poucos comentaristas ressaltaram a inovação que ele introduziu na política israelense atual.
Ele foi um dos poucos estadistas israelenses que, ao final da sua vida, compreendeu que nenhuma amizade externa, por mais calorosa que seja, consegue compensar Israel permanentemente pela falta de uma ordem regional harmoniosa.
Ele e Shimon Peres (ex-chanceler do governo Rabin e ex-primeiro-ministro) conseguiram fazer do mundo árabe e muçulmano a arena central da política externa israelense.
Em décadas anteriores, Israel foi forçado pela incessante hostilidade árabe a procurar os seus amigos bem longe do Oriente Médio.
Durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), o programa sionista foi aceito pelo Reino Unido. Depois da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), a ONU ofereceu um apoio inesperado à causa de Israel.
Por um "breve momento luminoso" nos anos 50, a França forneceu os aviões e a ajuda estratégica que ajudou Israel a manter as suas defesas.
Nas décadas seguintes, os Estados Unidos apoiaram o nosso país com constância e atenção. Nenhum país teve mais necessidade do apoio norte-americano do que Israel -ou mais sucesso em obtê-lo.
Moderação árabe
Tão logo atitudes moderadas árabes foram expressas, em 1993, os líderes israelenses recém-eleitos (do Partido Trabalhista, hoje na oposição) viram a abertura de uma oportunidade.
O primeiro ano do processo de paz teve efeitos sensacionais. Nas eleições seguintes, em 1996, Israel já tinha estabelecido relações diplomáticas com 15 Estados árabes.
Houve uma grande abertura com os árabes do norte da África, onde laços diplomáticos foram estabelecidos com o Marrocos e a Tunísia.
Na área do golfo Pérsico, Omã e Qatar indicaram a disposição de ter relações comerciais com Israel. A Arábia Saudita abrandou os elementos mais radicais do boicote árabe.
Integração econômica
Conferências econômicas em Casablanca (Marrocos), Amã (Jordânia) e Cairo (Egito) misturaram banqueiros, ministros e financistas israelenses com seus colegas árabes.
Os contatos com a ONU e o Vaticano se tornaram mais amistosos. Havia uma boa perspectiva de que Israel rapidamente se integrasse ao comércio e à política do Oriente Médio.
Pode ter sido prematuro falar de um novo Oriente Médio na época de Rabin e Peres, mas havia certamente um Oriente Médio diferente, que os israelenses nunca tinham visto antes.
É lamentavelmente verdade que a busca de uma nova ordem regional foi marcada e desfigurada por perdas trágicas de vidas em Israel, mas isso não cessou durante o período atual, em que o processo de paz permanece congelado. E impasses diplomáticos prolongados nunca beneficiaram a segurança e o desenvolvimento de Israel.
A triste realidade é que a fenomenal abertura do Oriente Médio para Israel agora começa a desmanchar. O Egito e, principalmente, a Jordânia estão desconcertados com algumas decisões recentes do primeiro-ministro Binyamin Netanyahu.
Omã e Qatar não buscam mais contatos estreitos com Israel. A conferência econômica de Qatar só ocorreu na semana passada por causa das recomendações tenazes da secretária de Estado norte-americana, Madeleine Albright.
Mais importante ainda do que a perda de posições conquistadas arduamente por Israel no norte da África e no golfo Pérsico é o fato ominoso de que os Estados Unidos foram alienados pela rejeição da modesta proposta da secretária Albright de um congelamento de curto prazo nos assentamentos (judaicos nos territórios palestinos de Gaza e Cisjordânia).
Minhas memórias pessoais de relações com o mundo árabe têm cerca de 45 anos. Eu não consigo lembrar de uma ocasião em que um pedido americano modesto tenha recebido uma rejeição brusca.
A manchete do jornal "The International Herald Tribune" de 1º de novembro, "Hussein acusa Netanyahu de traição", ilustra como o relacionamento Israel-Jordânia se deteriorou após o seu início cintilante, em 1995.
No primeiro ano do processo de paz, Israel passou de país mais isolado a país menos isolado do mundo. Desde a eleição de 1996 -e a mudança de governo que ela trouxe-, nós retrocedemos a uma solidão desafiadora que marcou as nossas primeiras décadas.
A verdade central sobre as soluções possíveis para a crise atual é que ela requer mudanças de atitude mútuas. A palavra-chave é convergência. Nada pode ser alcançado com proclamações de virtudes unilaterais.

World Media/"Haaretz". O "Haaretz" é um dos principais jornais diários de Israel, com tiragem de 65 mil exemplares. Inaugurou recentemente uma edição diária em inglês, disponível na Internet (http://www.Haaretz.co.il/eng).

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