São Paulo, domingo, 23 de novembro de 1997
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Crise financeira pode virar existencial

CLEBER MARTINS
DA REPORTAGEM LOCAL

Roberto Paulo da Silva, 54, não conseguia levantar da cama pela manhã, mas não era por preguiça. Tinha síndrome do pânico.
Cristina Bertoncello, 33, sofreu um processo de estresse e perdeu a conta do número de crises de gastrite e alergia que sofreu.
Mario Lamonica, 30, passava as noites em claro sentindo taquicardia, ansiedade e depressão. Detalhe semelhante: eles têm a mesma atividade, são empresários.
Os três fazem parte de uma parcela crescente de empreendedores que buscam nos divãs dos psicólogos e psiquiatras ajuda para superar os revezes do negócio próprio.
Em tempos de pacote econômico, alta dos juros e inadimplência, a saúde e a estabilidade emocional não escapam de sentir os reflexos.
Quando pequenas empresas estão em jogo, o problema muitas vezes se revela mais crônico.
Fechar contas, pagar funcionários, saldar dívidas e manter o padrão de vida deixaram de ser questões matemáticas para virar o estopim de crises existenciais para a maioria dos pacientes.
"O pequeno empresário assume o papel de responsável pelo sucesso ou pelo fracasso do negócio. E isso o leva à tensão, ao trabalho em excesso e à autocobrança", diz Isolina Proença, 42, psicóloga do Centro Psicológico de Controle do Stress, de Campinas (SP).
Ela explica que a qualidade de vida depende de quatro pilares: o social, o afetivo, o profissional e o da saúde. "Se a empresa não vai bem, certamente todas as outras áreas sofrerão as consequências."
Exercícios
"O peso da responsabilidade costuma ser maior sobre os microempresários", afirma Selene Passos, 34, assistente social da Clínica Psicológica do Instituto de Psicologia da USP (Universidade de São Paulo). Ela conclui: "Quase sempre, esses empresários depositam o sonho e as economias de toda uma vida no negócio próprio".
Segundo Selene, apesar de o serviço priorizar o atendimento infantil, a procura por parte de adultos, principalmente aposentados e empresários, está crescendo.
Mas não são só o estresse, os percalços financeiros e a situação econômica do país que levam empresários ao divã. Muitos querem discutir a escolha profissional.
"Há ex-assalariados que não se acostumam a uma vida diferente, sem holerite", diz o psiquiatra Luiz Cuschnir, coordenador do Iden (Centro de Estudos da Identidade do Homem e da Mulher), em São Paulo. Boa parte entra em um caminho sem volta, segundo ele, já que o mercado nem sempre absorve ex-empresários que mudaram de idéia sobre o negócio.
"Como a maioria das pequenas empresas é familiar, um problema com o empresário desestrutura toda a família", afirma Efraim Boccalandro, professor de psicologia da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo).
"Já atendemos casos de empresários e empresárias cogitando suicídio, mas a principal reclamação é pessoal e não financeira", diz Dulcineia Acuña, diretora do CVV (Centro de Valorização da Vida), que atende, por telefone, cerca de mil pessoas por dia.

Onde encontrar - Centro Psicológico de Controle do Stress, de Campinas: (019) 234-0288; Clínica Psicológica (USP): (011) 211-2420; CVV: (011) 883-4111; Iden: (011) 884-1591.

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