São Paulo, sexta-feira, 28 de novembro de 1997
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Bulgária aplaude 'Fosca' por 23 minutos

CASSIANO ELEK MACHADO
ENVIADO ESPECIAL A SÓFIA

Carlos Gomes dizia que, entre suas óperas, "O Guarani" era para os brasileiros, "Salvador Rosa" para os italianos e "Fosca" para "os entendidos".
Anteontem, na pré-estréia mundial da primeira montagem integral da versão final de "Fosca", em Sófia, cerca de 800 búlgaros entraram com no rol dos "entendidos de Carlos Gomes".
O teatro da Ópera Nacional da Bulgária assistiu a 23 minutos de aplausos para a encenação dessa obra do compositor campineiro.
"Nota 10", definiu com vibração econômica de palavras o estudante búlgaro Nicolay Kamenov.
Menos sintética e não menos vibrante do que o compatriota, a professora de filologia Maria Velikin chegou a esboçar uma teoria sobre Gomes. "'O Guarani' é excelente, mas soa muito italiano, muito próximo de Verdi. 'Fosca' tem elementos originalíssimos."
Sua leitura é semelhante à feita por Mário de Andrade, que escreveu, em 1873, que: "A 'Fosca' representa, dentro da obra do campineiro, o talvez único momento em que ele pretendeu avançar acima de si mesmo, e avançar em arte além do ponto em que jazia a italianidade sonora do tempo".
A professora Velikin garante que não conhece o autor de "Macunaíma" e que, até o ano passado, nunca tinha ouvido nada sobre Carlos Gomes (1834-1896), quando foi "apresentada" a "O Guarani", no mesmo teatro.
A história de Ceci e Peri inaugurou projeto da empresa São Paulo ImagemData -"Fosca" foi o segundo passo dele- que pretende concretizar montagens de todas as óperas do compositor. "Maria Tudor" é a próxima e seguirá o padrão desenvolvido nas duas primeiras: camarim globalizado.
"Fosca", por exemplo, contou com um maestro brasileiro, Luiz Fernando Malheiro, cenário e figurinos italianos, de Salvador Russo, e coro, orquestra, solistas búlgaros, com exceção da vocalista, a norte-americana radicada na Holanda Gail Gilmore. A direção cênica falou búlgaro, mas com sotaque dessas outras línguas, nas mãos de Plamem Kartaloff.
O presidente da Funarte, Márcio Souza, diz que a instituição trará os 172 membros dessa equipe -juntamente com 425 figurinos e quatro toneladas de cenários- para apresentações em seis capitais brasileiras, entre abril e maio.
Antes disso já será possível acompanhar essa montagem de "Fosca" no Brasil. Em dezembro serão lançados um vídeo e um CD triplo do espetáculo.
Por enquanto, "Fosca" é privilégio dos "entendidos", ou melhor, dos búlgaros, que assistem, de hoje a segunda, récita da ópera.
Muitos, como o médico Ivan Livtvinenco, pretendiam voltar hoje ao teatro da Ópera Nacional da Bulgária. Para ele, os pontos altos da montagem foram a qualidade da música e o luxo da montagem, sobretudo do figurino.
O jornalista local Dimitar Shumnaliev, do "Daily Troud", acrescenta: "Com a situação crítica que enfrentamos da política à cultura, é um milagre essa ópera".

O jornalista Cassiano Elek Machado viajou a convite da Funarte.

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