São Paulo, domingo, 30 de novembro de 1997
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Caymmi introduziu tema

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REPORTAGEM LOCAL

O mar sempre esteve aí, mas, em MPB, só mesmo depois de Dorival Caymmi é que ele foi se emancipar definitivamente.
Entre marchinhas carnavalescas, boemia, malandragem carioca e crônicas ufanistas, o mar bateu na areia quando se estabeleceu a tensão entre Caymmi e Luiz Gonzaga.
Este, escaldado do sertão, nem ousava falar do mar. A falta de água é que dominava seus forrós secos; quando a água vinha, nem chegava ao oceano.
Aquele, na praia baiana, encheu a música de areia e água salgada, em tons que iam da loa ("O Mar", "Coqueiro de Itapoã") à crônica contundente ("Noite de Temporal", "A Jangada Voltou Só").
Mais que depressa, os bossanovistas tomaram para si o mar como parquinho de lazer.
O barquinho ia, a tardinha caía, a garota de Ipanema deslizava suas curvas no beira-mar.
E o mar passou a ser disputado por duas outras vertentes. Uma vinculava-se ao cinema de Glauber Rocha e à canção de protesto, em temas como "Corrida de Jangada" (Edu Lobo e Capinan), "Arrastão" (Edu e Vinicius de Moraes), "Veleiro" (Edu e Torquato Neto). Denúncia social à vista.
Na outra ponta, a jovem guarda abocanhava uma alienação bem bossa nova, mas já sem toque aristocrático.
Ronnie Cord reparava no "Biquíni de Bolinha Amarelinha Tão Pequenininho"; Roberto e Erasmo pegavam onda paquerando "O Broto do Jacaré" e defendiam o topless (em 65!) em "Eu Sou Fã do Monoquíni". Não durou muito. Em 70 Roberto mudara de idéia e pedia a sua musa praieira: "Vista a Roupa, Meu Bem".
Os tropicalistas aportaram ao som de "Três Caravelas" ("a Pinta, a Nina e a Santa Maria"), apontando João de Barro para o futuro.
Caetano fincou seu guarda-sol em inglês ("Empty Boat"), em fado ("Os Argonautas"), ancorado no folclore ("Marinheiro Só"), paquerador ("Menino do Rio").
Mais anárquicos, os Mutantes fundavam, com "O Relógio", a possibilidade suicida que a marola ocultava.
Por aí passearam Baden Powell e Vinicius ("Menina bonita, pra onde é que ocê vai?/ Vou procurar o meu lindo amor no fundo do mar") e Paulinho da Viola ("Galo cantou às quatro da manhã/ Céu azulou na linha do mar/ Vou-me embora deste mundo de ilusão").
Intensificava-se o tempo da celebração épica. Clara Nunes fez aí sua carreira e Zé Ramalho encheu de surrealismo marinho seus martelos agalopados; Tim Maia decretou-se "Descobridor dos Sete Mares".
Era hora da neo-jovem guarda: Lulu Santos ("Areias Escaldantes"), Marina (as bundinhas de fora de "Uma Noite e 1/2"), Gang 90 (os mares do sul de "Nosso Louco Amor").
A vela estava aberta para mais hedonismo nos 90, de que "A Praieira" de Chico Science é ícone: "Uma cerveja antes do almoço/ É muito bom pra ficar pensando melhor".
Ano 2000 à vista, e aí?

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