São Paulo, domingo, 30 de novembro de 1997
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Palmeiras acende vela a São Velloso

ALBERTO HELENA JR.
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Hoje, o Palmeiras pode sacramentar sua passagem para a final do campeonato. Basta explorar o clima adverso ao Atlético que se adensou no Mineirão, na quarta. E, pronto!, eis o time de Felipão mais uma vez decidindo um título.
É, pelo menos, o que dirão os enfeitiçados por essa falácia chamada futebol de resultados. Mas quando, nestes últimos anos de Luxemburgo -até mesmo de Carlos Alberto Silva e Espinosa-, o Palmeiras deixou de estar na fita de chegada? Perdeu umas, ganhou outras, mais ou menos como o Grêmio de Felipão.
O que me chama a atenção neste caso é que, embora adotando um sistema ultradefensivo, o goleiro Velloso é quem tem levado a palma de herói, nas três partidas disputadas até aqui pelo Verdão. Ora, se o goleiro é considerado o melhor jogador do time, só pode ser porque foi acionado acima do normal. Logo, o sistema de marcação não deve ter sido tão eficiente assim, né? Pois, se o adversário consegue criar tantas chances de gol, cara a cara com o goleiro, como criaram Inter, Santos e Atlético, é porque a tal retranca foi varada com insistência superior à permitida pela proposta defensivista do treinador.
Peguemos como exemplo a emblemática seleção do tetra de Parreira, obra irretocada do futebol de resultados: até o momento fatal dos pênaltis, contra a Itália, Taffarel era uma incógnita para todos nós. Raramente era acionado, pois nosso time detinha o domínio da bola, tocava-a na medida exata para não perdê-la e só investia com Bebeto e Romário, mais preocupado em evitar o contragolpe do que em chegar ao gol inimigo.
Já o Palmeiras de Felipão, não. Oferece a bola ao adversário, retrai-se e acende uma vela a São Velloso e outra ao capeta Viola. E haja angústia.
*
Os técnicos Leão e Luxemburgo, por certo, levarão ferro da CBF, por suas intempestivas declarações sobre as atuações dos juízes da última rodada. Já os cartolas do Atlético, muito provavelmente, levarão um simples puxão de orelhas.
Afinal, esse é o jogo da cartolagem mesmo, qual surpresa?
*
O cartaz que anuncia a mostra de Portinari no Masp despertou-me algumas lembranças. Revendo o quadro dos meninos jogando bola, por inteiro, lá está o campinho de terra batida, bem em frente à casa de Portinari, em Brodósqui, e os meninos, no esférico feitio de bonequinhos dos primeiros pebolins, como a bola, alvo daquele estático movimento, que se estende até o cemiteriozinho ao fundo, quem sabe, a meta final desse estranho jogo da vida.
O ar parado de fim de tarde, um tanto sombrio, foi o mesmo que me acolheu quando ali cheguei, há mais de 30 anos. Fui como repórter da revista "O Cruzeiro", para denunciar o lastimável estado de deterioração das pinturas nas paredes da casa de Portinari e na capelinha ao lado.
E, de súbito, lá estava eu, dentro da obra do mestre, em três dimensões, tudo igualzinho: a bola rolando, os meninos parados como se estivessem correndo, o cemitério ao fundo, congelando o tempo que parece correr também sem sair do lugar.

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