São Paulo, terça-feira, 2 de dezembro de 1997 |
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Audrá Jr. conta a história de seu tesouro
MARCELO REZENDE
Audrá Jr., 76, em "Memórias de um Produtor", fala da trajetória da Cinematográfica Maristela, fundada por ele em 1950 e que, durante oito anos, tentou ser -em suas próprias palavras- uma alternativa ao modelo hollywoodiano oferecido por sua principal concorrente, a Vera Cruz. "No início", disse em entrevista à Folha, "a intenção era fazer algo próximo do neo-realismo; queria aproveitar as idéias do neo-realismo, filmar na rua. Mas isso foi antes de abrirmos nossos estúdios. Depois, tudo ficou menos improvisado." Segundo ele, o desejo original se diluiu, mas a vontade de "realizar filmes brasileiros com influências italianas e francesas" prosseguiu. Um pouco do resultado dessa invenção poderá ser visto também no MIS, que, comemorando o lançamento do livro (editado pela Silver Hawk), promove um pequeno ciclo dos filmes realizados pela Maristela (veja quadro com a programação nesta página). Em suas memórias, Audrá Jr. conta de que maneira, após uma desavença com seu irmão sobre a empresa da família -Cia. Fabril de Juta Taubaté S/A-, decide ter um negócio próprio e termina optando pelo cinema. Um meio que conhecia apenas como espectador. Chega aos filmes pelo teatro, após conhecer o diretor italiano Ruggero Jacobbi, que liderava uma dissidência no Teatro Brasileiro de Comédia. Jacobbi o apresenta a Mário Civelli, e este, por fim, lhe mostra o mundo da produção cinematográfica. "Os técnicos brasileiros não existiam. Os poucos estavam no Rio de Janeiro, que já tinha um cinema funcionando, apesar de estar voltado para o mercado nacional. A nossa idéia era a Argentina, que tinha um cinema mais desenvolvido. Os técnicos eram bons e baratos." O primeiro projeto foi a adaptação de uma obra de Mário Donato, o livro "Presença de Anita". Pouco depois, se interessa por "Meu Destino É Pecar", romance que o dramaturgo Nelson Rodrigues escreveu sob pseudônimo. Mas esses eram, segundo Mário Audrá Jr., os anos de aprendizado, quando sabia que o custo para aprender sua nova profissão seria, ainda, em dinheiro. Seu segundo momento é quando consolida os estúdios comprados no bairro do Jaçanã e passa a acreditar na possibilidade de incrementar a produção independente. "No momento em que tivesse um estúdio -com toda a estrutura montada- eu acreditava que apareceria gente disposta a fazer cinema. Pessoas que, embora não entendessem nada de filmes, iriam se apoiar em nós para aprender. A grande chave era então a co-produção, que hoje significa uma outra coisa." Os estúdios lançam em 1950 "Presença de Anita", dirigido por Ruggero Jacobbi. No ano seguinte, é a vez de "O Comprador de Fazendas". Audrá Jr. descobre que pode interferir não apenas nos negócios da empresa. Passa a opinar sobre a qualidade dos roteiros e interfere diretamente na elaboração das histórias. A Vera Cruz passa a ver a Maristela como uma concorrente. "Detesto as comparações com a Vera Cruz. A Vera Cruz era fechada. Era um negócio hermético. A Maristela foi concebida para ser um negócio aberto: incentivar o produtor independente e chamar diretores de fora", diz. Curiosamente, um desses cineastas era um brasileiro: Alberto Cavalcanti, que, após uma carreira na Europa, sobretudo na Inglaterra e França, voltava ao país para realizar sua primeira obra brasileira, "Simão, o Caolho". "Eu o contratei. Mas minha intenção era fazer um outro filme com ele: 'Aquarela do Brasil'. Eu disse que 'Simão' não era comercial. Foi horrível. Eu lembro que disse: 'Esse filme pode até dar dinheiro, mas só em São Paulo'. Eu acho o filme maravilhoso, mas é filme para intelectual. Não é?" Sobre o atual momento do cinema brasileiro, pensa que não haverá futuro se a figura do produtor continuar marginalizada. "O diretor não aceita o produtor. O que ele quer mesmo é um financiador." Livro: Memórias de um Produtor Autor: Mário Audrá Jr. Lançamento: Silver Hawk Quanto: R$ 36 (161 págs.) Texto Anterior: Coluna Joyce Pascowitch Próximo Texto: Estúdios do Jaçanã fundaram-se em paradoxos Índice |
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