São Paulo, quarta-feira, 3 de dezembro de 1997
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País depende da situação externa, diz FHC

CLÓVIS ROSSI
DO ENVIADO ESPECIAL A LONDRES

O presidente Fernando Henrique Cardoso admitiu ontem, em palestra para um nutrido grupo de empresários britânicos e brasileiros, que o governo não tem o total controle da situação, em função da crise internacional.
"Não estamos sozinhos no mundo e muitas condições não dependem de nossa vontade nacional", disse o presidente ao abrir a "Conferência Brasil", organizada conjuntamente pela CBI (Confederação da Indústria Britânica) e pelo banco HSBC, que comprou recentemente o Bamerindus.
"O custo e o ritmo dos avanços poderão ser afetados por circunstâncias externas", acrescentou.
Mas o discurso de FHC ao empresariado foi, acima de tudo, um recado no sentido de mostrar a firmeza do governo em manter o rumo da política econômica, cuja direção geral goza de inequívoco respaldo empresarial.
"Haja o que houver, fiquem certos de que não haverá desvios ou retrocessos", afirmou FHC.
Seu discurso terminou sob fortíssimos aplausos, "pouco usuais" em ocasiões como essas, conforme a avaliação de Gary Campkin, chefe de Mercados Internacionais da CBI.
Para Campkin, os aplausos "foram além da mera cortesia".
Em demonstração adicional de que o Brasil está na dependência de fatores externos que não pode controlar, o presidente introduziu uma pequena, mas significativa alteração no seu discurso previamente distribuído.
O original dizia que "o Brasil saberá responder à altura aos desafios e oportunidades que o momento histórico nos apresenta".
FHC trocou o "saberá" por "não tem alternativa se não (responder à altura etc.)", falando sempre em inglês.
O presidente do Banco Central, Gustavo Franco, também tocou no mesmo tema, ao admitir que "não há muita criatividade numa situação internacional como esta".
Mas Franco acha que não há dependência de capitais externos e, sim, "interdependência". Ele não vê mal em depender do exterior, até porque, ironiza, "os projetos albanês e norte-coreano fracassaram totalmente".
É uma alusão a um ex-regime comunista (Albânia) e a um dos poucos remanescentes (Coréia do Norte), que tentaram um caminho de total isolamento externo.
Gustavo Franco disse ainda que há dois erros que não podem ser cometidos: nem subestimar a crise e ficar excessivamente dependente do capital externo nem "exigir sacrifícios demais do país".
Como é óbvio, acrescentou: "Procuramos não cometer nenhum dos dois erros, mas não temos bola de cristal".
Relações públicas
Os aplausos fortes recebidos por FHC são um sinal de que a city londrina, o coração financeiro da Europa, readquiriu a confiança no Brasil?
As respostas obtidas pela Folha variam muito. Campkin, da CBI, depois de ressalvar que tampouco tem bola de cristal, diz que a resposta a esse tipo de crise inclui também muito de relações públicas, papel que ele acha que FHC desempenhou à perfeição. Mas o "Financial Times"acha que não (leia à pág. 1-4).
Por fim, a Folha ouviu também uma avaliação que contesta o coração do raciocínio do presidente. Os problemas vividos pelo país não seriam decorrência de fatores externos, mas do fato de o governo ter permitido um duplo e mortal déficit (o das contas públicas e o das contas externas).
Por essa última avaliação, sem esses dois déficits, não teria havido qualquer ataque especulativo contra a moeda brasileira.

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