São Paulo, quarta-feira, 3 de dezembro de 1997
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As mortes nas UTIs neonatais

JOÃO EDUARDO CHARLES

Os fatos recentes envolvendo o hospital Tide Setúbal e a maternidade Vila Nova Cachoeirinha explodiram nas manchetes dos jornais, denunciando mortes de crianças em berçários e UTIs neonatais como um fato inesperado.
A imprensa, no legítimo papel de buscar a verdade, investiga as causas e o provável envolvimento de profissionais. Seriam mal treinados a enfermagem, os médicos do berçário, os diretores? Quem é o culpado pelas mortes dos bebês?
Primeiro, devemos entender que crianças prematuras, produtos de gestação de alto risco, apresentam baixa resistência às infecções. Portanto, seu índice de mortalidade é muito maior. Devemos ter cautela ao analisar as causas que efetivamente levaram-nas ao óbito.
Em segundo lugar -e o mais importante-, não se pode esconder da sociedade a ação da Prefeitura de São Paulo. É inaceitável que a Secretaria Municipal da Saúde, que mantém um sistema com as características do PAS -modelo privado de atendimento à população, com custo pelo menos duas vezes maior do que o do sistema anterior-, tenha permitido que um hospital com características excepcionais, como o Cachoeirinha, tenha sido tão negligenciado.
A maternidade de alto risco não foi transformada em unidade do PAS. Como consequência, não obteve neste ano nem 50% do orçamento a ela destinado, impossibilitando a administração racional.
A taxa de ocupação da UTI neonatal estava superada em 200%. Isso se torna um escândalo quando detectamos que a maior causa dessa superlotação se deve ao encaminhamento de pacientes provenientes das cooperativas do PAS.
Criou-se um perigoso paradoxo: a prefeitura que transfere às cooperativas somas astronômicas permite que elas transfiram casos de alta complexidade para hospitais como o Cachoeirinha, que não recebe nem o orçamento mínimo.
Os altos rendimentos dos dirigentes dessas cooperativas -transformados em mansões e carros sofisticados- deveriam estar sendo usados para garantir a vida dos cidadãos. Entidades ligadas à saúde já alertaram sobre as consequências da ação irresponsável da administração municipal.
E o que fizeram os dirigentes municipais? Destinaram verbas nunca antes oferecidas para a manutenção de um sistema "cooperativo" que, na verdade, só oculta interesses econômicos de poucos.
O que nos alenta é ver o Judiciário agindo liminarmente, bloqueando os bens do antigo secretário e de seus "colaboradores" -responsáveis pela implantação desse malfadado plano- para garantir uma possível reorganização da saúde na cidade de São Paulo.

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