São Paulo, quarta-feira, 3 de dezembro de 1997
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Videogame não atropela ninguém

MARIA ERCILIA
DO UNIVERSO ONLINE

Semana passada alguém no Departamento Nacional de Trânsito acordou preocupado com a violência nas estradas brasileiras. A preocupação não resultou num programa de educação de motoristas nem de melhoria das estradas nem de combate ao álcool.
Não, havia uma solução muito mais rápida, barata e eficiente: foi proibida a venda de um videogame!
Por ordem do Ministério da Justiça, a distribuidora Brasoft teve que retirar do mercado o Carmageddon, um game que já vendeu alguns milhares de cópias no Brasil. A empresa se dispôs, durante alguns dias, a trocar o game por algum outro dos títulos que distribui.
Quem vender ou distribuir Carmageddon pode ser até multado e preso. É um caso inédito no Brasil. A Brasoft acatou a decisão e ninguém mais protestou. Aliás, a Brasoft vai produzir um CD-ROM educativo sobre trânsito em parceria com o Denatran.
Carmageddon não é nenhuma obra de arte incompreendida. Ultrapassa os limites do mau gosto. Você dirige um carro, mas seu objetivo não é ganhar dos outros. É destroçar velhinhas, cachorros e o que aparecer de inofensivo e frágil.
Quanto mais indefeso o alvo e quanto mais sangue espirrar, mais pontos. Para disfarçar um pouquinho, o jogo tem uma opção menos cruenta, que ninguém usa: quem quiser, pode escolher zumbis ou robôs, em vez de gente, para estraçalhar. Essa opção existe na versão européia e brasileira, mas não na norte-americana.
A inspiração de Carmageddon é um filme vagabundo dos anos 70, "Death Race 2000" (www.mcn.net/~netrencher/dr2k.html).
É um game até meio diferente. Na maioria dos roteiros de game tem muita violência, mas o herói é "do bem". Em Carmageddon, o alvo é fazer o máximo de mal possível, usando um carro como arma.
Mas isso não é justificativa para censura. O game é tão exagerado que não dá para levar a sério. Quem joga Carmageddon se diverte justamente com o exagero da coisa. É o mesmo que a Sociedade de Proteção aos Animais querer tirar Tom e Jerry do ar.
Se pelo menos houvesse alguma evidência de que um game pode influenciar no comportamento de uma pessoa ao volante, haveria alguma razão para essa proibição. Do jeito que foi aplicada, não é menos que arbitrária.
Talvez os games violentos tenham até uma função social, aliviando os instintos de forma mais inofensiva. Um racha na Marginal tem muito mais potencial para estragos que uma corrida sangrenta no computador. Não ia sobrar muito game no mercado se o pessoal do Ministério da Justiça resolvesse ir fundo mesmo no Nintendo dos filhos.

E-mail: netvox@uol.com.br

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