São Paulo, quinta-feira, 4 de dezembro de 1997
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DOLLY NA MATERNIDADE

Até hoje, nenhum invento que permitisse a reprodução artificial humana deixou de ser utilizado. Mesmo tendo causado a princípio repulsa, essas técnicas aos poucos saíram dos laboratórios para as clínicas médicas. Agora, a clonagem parece seguir o mesmo caminho desses métodos, mas com mais rapidez. Cientistas já admitem o desenvolvimento de técnicas de replicação humana. Há nove meses, geneticistas diziam que não havia sentido em repetir com humanos a experiência Dolly.
Nos anos 60, dominicanos e jesuítas discutiam se a inseminação artificial por esperma que não o do marido seria adultério. Nos 70, escritores, cientistas e advogados condenavam os primeiros experimentos com bebês de proveta. O método geraria monstros, acabaria com o amor, criaria exércitos de robôs. Um filho gerado por inseminação artificial seria legítimo? A questão foi discutida pela Justiça de Nova York em 1973.
Hoje, quase ninguém se importa com bebês de proveta e o primeiro deles nasceu há menos de 20 anos. No começo dos anos 90 ainda causavam celeuma as gestações artificiais e múltiplas de bebês gêmeos, que nascem prematuros e muitas vezes com problemas de saúde. Agora, a prática é quase uma mera técnica de planejamento familiar. A convivência com o que em certo momento é considerado sacrilégio fez caducar certas restrições à intervenção contranatural no nascimento humano.
Cientistas mais críticos não acreditam no controle da aplicação de técnicas já desenvolvidas. A prática tem dado razão a eles. No entanto, pelo menos hoje se forma um consenso sobre a manipulação genética, cujo advento marcou uma mudança qualitativa no avanço -e nos perigos- da biologia. Tal consenso ficou manifesto na "Declaração Universal do Genoma Humano", elaborada por delegados de mais de 80 países, mas que ainda não foi ratificada na ONU nem tem valor de lei internacional. Ainda que alterações genéticas e mesmo a clonagem, como já argumentam cientistas, tenha valor médico, o liberalismo nessa questão pode permitir abusos de consequências tétricas. Espera-se que a comunidade internacional consiga impor limites à manipulação da identidade biológica humana, mas sem desconhecer que as descobertas em si, diferentemente de seus possíveis usos, não podem nem devem ser contidas.

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