São Paulo, segunda-feira, 8 de dezembro de 1997
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Corte no salário foi idéia da CUT, afirma Paulinho

SÉRGIO LÍRIO
DA REPORTAGEM LOCAL

O acordo de redução de salários e de jornada de trabalho que a Força Sindical deve fechar amanhã com a indústria de autopeças aparentemente serviu para reafirmar velhas posições ideológicas.
A Força, do pefelista Luiz Antônio de Medeiros, à favor da idéia, vai dizer sim. A CUT, braço do PT, disse não à proposta.
Mas, segundo Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo e vice da Força, as aparências enganam, no caso da CUT.
Nessa entrevista à Folha, Paulinho afirma que, não fosse o interesse político-partidário da cúpula da CUT, os sindicatos dos metalúrgicos filiados à central rival teriam fechado acordo. "A proposta de redução de 20% da jornada e de 10% no salário foi deles."
Segundo ele, a CUT está apostando na crise para fortalecer suas críticas ao governo FHC, o que poderia favorecer a candidatura de Lula nas próximas eleições presidenciais. "Demissões prejudicam a imagem do governo", acha.
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Folha - Vocês estão perto de fechar um acordo com as autopeças. Como surgiu a proposta?
Paulinho - A proposta de redução da jornada de trabalho em 20% e de salários em 10% não é nossa. Foi a CUT que fez. Foram esses caras, que agora se dizem contra, que a fizeram.
Folha - Mas a CUT sempre foi contra a redução de salários. Quem da central se mostrou a favor de um acordo?
Paulinho - Há cerca de três semanas nós fomos procurados pelo Sindipeças para negociar a redução de 25% nos salários e na jornada. Nessa reunião, que não era pública, o negociador do Sindipeças (Drausio Rangel, advogado) disse que já tinha estado com dirigentes da CUT.
No mesmo dia, o Paulo Sérgio (Ribeiro Alves, presidente da Federação Estadual dos Metalúrgicos da CUT) e o Grana (Carlos Alberto, secretário-geral do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC) nos convidaram para discutir o assunto. Foi nessa reunião que eles apresentaram a proposta.
Folha - Se havia sindicalistas da CUT favoráveis, porque a central passou a criticar a idéia?
Paulinho - Eu não sei o que houve, mas acho que entrou o esquema político-partidário. Esses dirigentes que começaram a negociar foram afastados e entrou o Vicentinho (Vicente Paulo da Silva, presidente da CUT). Foi interferência da cúpula da central.
Um sinal dessa interferência foi a assembléia da última quarta-feira na porta da Volks, que também está propondo redução de salários. Vários políticos do PT e dirigentes da CUT foram para lá fazer discurso. Eu não sei quem estava, mas não eram os mesmos que negociavam conosco.
Folha - Qual seria o interesse político da cúpula da CUT em barrar a negociação dos sindicatos?
Paulinho - Eu acho que dá mais voto falar mal do governo. Se você deixar as pessoas serem demitidas, fica mais fácil fazer discurso contra a política econômica.
Folha - Você acha que a intenção é beneficiar a candidatura Lula?
Paulinho - Não sei. Mas demissões prejudicam a imagem do governo.
Folha - Qual o salário médio dos metalúrgicos nas autopeças?
Paulinho - R$ 912.
Folha - Como você explica para um cara que ganha R$ 912 que o salário dele vai ser reduzido?
Paulinho - Queremos garantir o emprego nas fábricas que estiverem com problema. Eu vou dizer o seguinte: você prefere reduzir seu salário ou perder o emprego? Quem decide é o trabalhador.
Folha - O trabalhador não vai pagar a conta sozinho?
Paulinho - Não. O que queremos é mostrar à sociedade que estamos dispostos a fazer um sacrifício nesse período de turbulência. Não é só uma questão de entregar os anéis, mas de ceder os dedos para não perder a mão. Acho que, se fizermos esse sacrifício, teremos mais autoridade para cobrar do governo soluções para a crise.
Folha - Esse sacrifício não pode piorar a situação, já que a redução de salário tira dinheiro da economia e diminui o consumo?
Paulinho - O pior para a economia e para o trabalhador é o desemprego. Aí, em vez de perder 91% ou 90% dos seus ganhos, a pessoa perde tudo.
Folha - A adoção de banco de horas, sem corte nos salários, não resolveria a questão?
Paulinho - A própria experiência no ABC mostra que o banco de horas só funciona nos períodos normais de sazonalidade. Se ele pudesse garantir empregos, a Volks, que foi uma das primeiras a adotar o sistema, não falaria em demitir 7.000 empregados.
Folha - As empresas não estão aproveitando o momento de crise para mexer no custo da mão-de-obra, coisa que elas já vem tentando fazer há algum tempo?
Paulinho - Não acho que seja o caso no setor de autopeças. A indústria foi muito atingida com a abertura comercial. Depois de muita briga nossa e dos empresários, a alíquota de importação foi elevada para 7,2%. Mas já foi de 2%. Isso levou ao fechamento de fábricas e o fim de muitos empregos. Os juros e o pacote estão piorando a situação.
Folha - Os custos de mão-de-obra no Brasil são caros?
Paulinho - São. Não chegam aos 102% do José Pastore (economista da USP), mas acho que as empresas pagam encargos demais e isso dificulta a criação de vagas.

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