São Paulo, segunda-feira, 8 de dezembro de 1997
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Ben Jor cai na rede

RICARDO FOTIOS
DO UNIVERSO ONLINE

No melhor estilo "obrigado, amigos", Jorge Ben Jor acaba de lançar "Músicas Para Tocar em Elevador", seu 28º disco de carreira, pela Sony Music, com 12 participações especiais.
O show de lançamento do CD será no próximo dia 12, em Salvador, no Candyall Guetho Square, espaço de Carlinhos Brown e Timbalada.
Ao mesmo tempo, o cantor e compositor faz sua estréia na Internet. Sob o tema "CyberJorge" -um trocadilho com a expressão "Salve Jorge!", da música "Jorge de Capadócia", um de seus grandes sucessos-, o site oficial de Ben Jor entra hoje na rede mundial de computadores. O endereço é http://www.uol.com.br/benjor.
A home page de Ben Jor traz discografia completa, trechos de música, galeria de fotos, agenda de shows, curiosidades e as várias fases de sua carreira, contadas pelo próprio cantor.
O objetivo do cantor é transformar as páginas virtuais no mais completo acervo sobre sua carreira.
E, como não podia deixar de ser, o site traz informações completas do novo disco, que desfila 13 regravações e duas músicas inéditas de Ben Jor.
Cada uma das releituras foi feita por um artista ou banda, como Fernanda Abreu, Barão Vermelho, Skank, Placa Luminosa e Paralamas do Sucesso.
No dia 16, terça-feira, às 21h, Ben Jor participará de um bate-papo no UOL. Para entrar no chat, o enderço é chatter.uol.com.br/batepapo.
Em entrevista exclusiva ao Universo Online, Ben Jor contou que o disco demorou um ano e meio para ficar pronto porque as gravadoras colocaram vários obstáculos na participação de seus artistas.
"A gente tinha 22 convidados e só conseguimos a participação de 12", explica. Ben Jor contou ainda como foi o processo de produção do novo trabalho: "Eu não quis participar de nenhuma das gravações para não influenciar o trabalho".
Fazendo uma análise de sua carreira, o autor de "Chove Chuva" lembrou do início de sua vida artística. "Não era uma coisa que me interessava muito", conta. "Gravei os cinco primeiros discos da minha vida de uma só vez porque queria ficar livre daquele contrato logo."
Na época dos grandes programas musicais da televisão brasileira, Ben Jor participou de três deles: o pop "Jovem Guarda", "Divino Maravilhoso", com os então tropicalistas Gil e Caetano, e "O Fino da Bossa", que exaltava o recém-criado movimento da bossa nova.
Sua passagem por este último, aliás, causou um certo desconforto nos bastidores musicais da época.
"Foi um alívio para mim quando falaram que eu não estava mais no 'O Fino da Bossa'. Dei graças a Deus", lembra. Leia a seguir trechos da entrevista.
*
Universo Online - Sua home page dedica bastante espaço ao seu novo disco, "Músicas Para Tocar em Elevador", que é um tributo a Jorge Ben Jor...
Jorge Ben Jor - Não, não é um tributo a mim, porque foi uma idéia do diretor (artístico), que hoje não está mais na Sony (a gravadora Sony Music), que é o Jorge Davidson. Agora, ele está na BMG Ariola.
O Jorge Davidson é discófilo, então ele tem tudo meu e eu não sabia. Quando eu fui para a Sony ele falou: "Pô, xará, a gente pode fazer boas coisas aqui".
Aí ficou nisso. A idéia surgiu há um ano e meio. Ele chegou e falou assim: "Já que a gente tá na Sony e a PolyGram tá lançando umas coisas suas aí, a Som Livre vai lançar também, que tal a gente aproveitar o pessoal que já gravou suas músicas?". De cara, a idéia era fazer o disco só com o pessoal novo. Então tinha a Fernandinha Abreu, que já tinha gravado, o Skank também. O Paralamas já tinha gravado, Marisa Monte...
Aí ele falou: "A gente pode fazer um disco com cada um fazendo o seu estilo, cada um escolhe uma música...". Topei, adorei a idéia. O problema foi depois para conseguir a autorização das gravadoras. O disco demorou um ano e meio pra sair por causa disso. Eram muitas gravadoras. Eles pensavam que o disco ia concorrer com o lançamento deles também. Mas é um disco totalmente diferente.
UOL - E como foi a produção do disco? Cada artista cuidou de sua gravação?
Ben Jor - Para mim foi o disco mais fácil de fazer. Eu só chegava no estúdio e falava "bota aí". Aí ouvia as músicas e colocava a voz.
O único probleminha é que a maioria das músicas não estava no meu tom. Então eu tinha que ficar ouvindo e ouvindo, até a voz chegar junto.
UOL - A grande variedade de estilos musicais dos artistas envolvidos não o confundiu?
Ben Jor - É, tem vários estilos. Mas eu tô sempre ouvindo coisas novas e diferentes. E valeu, foi muito útil dessa vez. A da Fernanda Abreu, que foi a primeira música que eu coloquei voz, foi uma surpresa.
Eu estava esperando um funk, todo sensual da Fernandinha. Aí eu falei: "Pô, esse tipo de música eu ouvi lá na França, estava tocando nas discotecas. Ela fez isso, cara. Vou tentar chegar junto".
É o drum'n'bass, que eles falam, o jungle... Que é a dança do momento lá. Foi a gravação mais diferente de todas do disco. Adorei. Que legal, é coisa nova.
UOL - Aliás, a Fernanda Abreu é uma das artistas da nova geração que mais lhe prestam homenagens. Você gosta de homenagens?
Ben Jor - Eu gosto muito. Acho muito bom. Acho que é o reconhecimento e afinidade que eles têm com meu trabalho. E grandes cantoras, como foi o caso da Marisa Monte, já fizeram isso.
Para mim é sempre uma surpresa, porque não são músicas minhas dos anos 80. São músicas de 60, do meu começo. A Fernandinha gravou uma de 70, que é "Jorge de Capadócia".
Mas a Marisa, a música que ela gravou no disco dela, é da década de 60. Foi do meu primeiro disco. Você pode ver que também são todas músicas de 60 e 70 no "Músicas Pra Tocar em Elevador". E cada um escolheu a sua, não teve nada de conversa antes.
UOL - E você não teve curiosidade, não quis participar de nenhuma gravação?
Ben Jor - Eu não quis por causa disso. Eu falei pro Jorge (Davidson): "Se a idéia é essa, eu não vou em gravação de ninguém pra não ter influência". Eu queria uma coisa diferente mesmo.
Queria que cada um fizesse seu arranjo próprio, cada um escolhesse seu produtor. Aí reclamaram, porque mandavam as gravações pra mim e eu botava a voz. Tinha pré-mixado, que era para eu ver se estava legal. Aí eu falava: "Pra mim tá legal!". Aí os caras falavam: "Não, mas pra gente não tá. A gente quer fazer isso, aquilo, mudar o arranjo que não ficou bom".
O Ultraje a Rigor, por exemplo, chegou e falou: "Esse arranjo que a gente fez não tá legal, foi muito rápido. Quero mexer aí". O Barão (Vermelho) também. O Frejat falou: "Olha, tá faltando uma coisinha. O Serginho (do Trombone) também tá trabalhando no arranjo. Dá mais um tempo, não tá legal".
Eu achei legal, porque todos estavam fazendo com gosto uma coisa que estava me agradando, porque todo mundo quer fazer melhor. Eu achei o máximo.
UOL - Quem deu mais trabalho nesse sentido? Qual dos artistas quis fazer mais mudanças?
Ben Jor - Olha... O Carlinhos Brown quis mudar também, porque achou que ele teve pouco tempo pra fazer. Reclamou por que não deu pra botar mais tambores. Bom, foi isso... teve o Carlinhos, eu te disse o Barão, o Ultraje... e o Skowa também.
UOL - Foram coisas como essas que fizeram com que você mudasse de nome artístico, não é? Foi idéia sua?
Ben Jor - A mudança do nome artístico aconteceu quando eu fui para a Warner, em 1985. Já estava lá o presidente que foi da PolyGram, o André Midani. E ele já sabia que eu tinha esse problema com direitos autorais no exterior e então ele me disse que o mesmo acontecer aqui no Brasil, só que através das gravadoras.
E eu já tinha visto isso. Quando eu lançava um disco pela Som Livre, e eu fiquei cinco anos na gravadora, tinha propaganda na televisão... Aí a Polygram aproveitava e lançava uma coletânea, como se fosse um disco novo. E atrapalhava.
Realmente atrapalha... Uma vez veio um amigo meu e disse: "Jorge, comprei um disco novo seu, mas é tudo música antiga". Aí eu tinha de explicar e dizia "Não, o novo é da Som Livre, não é da Polygram".
UOL - Nessa mudança não houve então nenhuma inspiração esotérica ou religiosa?
Ben Jor - Não, não teve. Talvez tenha baixado essa inspiração que você fala, mas não foi proposital.
UOL - Hoje você é mais Jorge ou mais Ben Jor?
Ben Jor - Mais Ben Jor. O nome pegou mesmo. Todo mundo incorporou.
UOL -E como está Ben Jor no cenário musical atual?
Ben Jor - Acho que o Ben Jor está bem desde que foi criado, há dez anos, o Ben Jor descobriu um público novo e, por outro lado, um público novo descobriu o Ben Jor.
UOL - E te preocupa se as rádios tocam ou não suas músicas?
Ben Jor - Não é que eu me preocupo. Eu, graças a Deus, sempre fiz shows, com rádio ou sem. Tanto aqui quanto no exterior. Sempre, sempre. Mesmo sem estar nas paradas, sem estar na mídia.
UOL - Falando dessa época do Jorge Ben, quando você iniciou sua carreira, em 1963, já entrou para o mercado com o sucesso "Mas, Que Nada"...
Ben Jor - É, tinha outros sucessos também daquela época, como "Chove Chuva"...
UOL - Mas essa música foi o primeiro sucesso.
Ben Jor - Sim, mas fiz muitas música na mesma época. O primeiro disco pra mim foi uma coisa assim... Na verdade, eu entrei na música porque eu estava no meio musical. Coisa de amigos que eram músicos, entende? Mas não era o que queria.
Tanto que no meu primeiro sucesso era uma coisa que não me interessava muito. Falavam que eu era o primeiro cantor que vendia 100 mil discos. Eu ficava imaginando o Maracanã lotado, cada um com um disco meu na mão. Achava legal.
UOL - Você está dizendo que música não era o seu negócio?
Ben Jor - Não, não era porque eu estava estudando. Meu pai queria que eu fosse advogado. E eu tinha outro problema: minha mãe gostava de música, mas queria que eu fosse médico pediatra.
E eu queria ser jogador de futebol. E a gravadora queria que eu fosse músico... Pô, que lance louco. Nunca tinha visto contrato, cheio de cláusulas... Eu não podia sair da cidade.
Para viajar tinha de pedir para os caras. Aqueles coisas todas, né? Cheio de compromisso.
Aí veio um convite da Record, que tinha um programa, "O Fino da Bossa", e me convidaram pra apresentar seis programas. Aí fiz o primeiro, o segundo... E eu chegava sempre a São Paulo no sábado, na segunda-feira e eu ficava o fim-de-semana aqui.
Aí chegou num sábado, eu viajei no mesmo avião que Erasmo Carlos e ele falou: "Já que tu vai estar por aí, canta com gente lá no 'Jovem Guarda'". Pô, e adorei e cantei no programa.
Na segunda-feira me expulsaram. Ninguém falou nada, mas eu estava fora. Não estava mais escalado para "O Fino da Bossa", porque e cantei lá, na "Jovem Guarda".
UOL - Você se considera um artista pop?
Ben Jor - Sim, eu me considero um artista pop. Eu sempre fui pop.
UOL - Mas você não chegou a participar como liderança do movimento tropicalista...
Ben Jor - Não, não. Só acompanhei. Acompanhei bem, nós éramos amigos.
A gente conversava e foi bonito, porque a ideologia deles, a filosofia deles, embora totalmente diferente da minha, não chocava comigo.
Era uma coisa boa, sabe? Gil e Caetano sempre tiveram as idéias deles, que nunca chocavam com as minhas, nem com a de ninguém do grupo na época. Eu me sentia bem no meio deles também.

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