São Paulo, sexta-feira, 12 de dezembro de 1997
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SPEED GARAGE

ALEXIS BERNIER
DO "LIBÉRATION"

Londres, Twice as Nice, The Colosseum Club, 2h30 da madrugada de um domingo para segunda.
Com o corpo timidamente coberto por um minivestido transparente, os seios prontos para saltar do sutiã, uma deusa negra se agita.
A seu lado, taça de champanhe em uma mão, baseado na outra, um jovem dândi branco, com mocassins e paletó de veludo rubi, acompanha os versos de "Hold Your Head Up High", de Boris Dlugosh, que Spoony, o DJ membro da London Dreem Teem, toca pela segunda vez.
Pode-se dizer que a Inglaterra se recusa a ir dormir.
Desde o último verão europeu, o país vive ao ritmo do speed garage, estilo híbrido, permeado de drum & bass e de garage (a forma vocal da house, derivada do gospel e da disco music, inventada em Nova York há mais de dez anos), que está transformando a cena club.
Baixos arredondados e elásticos -derivados do reggae e jungle-, vozes de divas lascivas alongadas ao máximo e, às vezes, um MC que arrota (como em "A London Thing", de Scott Garcia).
Tudo sobre um ritmo sustentado, mas não frenético, e baterias enérgicas. "Tudo o que queríamos fazer era dar um pouco de vivacidade a uma música (o garage norte-americano) um pouco espiritual demais para que alguém tivesse vontade de se balançar com ela", diz Matt "Jam" Lamont, um de seus melhores produtores.
Assim descrito, o garage inglês, ritmado e melódico, é uma perfeita máquina para dançar.
Apesar de existir há anos, foi preciso esperar que o produtor americano Armand Van Helden fizesse um mix, colocando no mesmo caldeirão o "Sugar Is Sweeter", de CJ Bolland, e o "6 Underground", do Sneaker Pimps.
Foi o que bastou para que o garage inglês estourasse. As revistas especializadas, como "Muzik" ou "Mixmag", já estão em seus décimos artigos sobre o tema.
Para Tony Portelli, chefe "speedizado" do minúsculo selo 4 Liberty, lançado há cinco anos, com vinis de garage nova-iorquinos, speed garage é uma expressão que todo mundo detesta.
"Nenhum produtor de garage digno desse título na Inglaterra jamais o utilizou. Na verdade, é um termo que utilizavam os puristas norte-americanos para gozar da nossa cara. Mas se tornou uma fórmula mágica para encontrar os chefões das grandes gravadoras."
Portelli tirou a sorte grande com a London Dreem Teem -DJ Spoony, Timmi Magic e Mikee B-, uma irmandade elegante de produtores-DJs cujo CD "The London Dreem Teem in Session" já vendeu dez mil exemplares. Nada mal para uma companhia sem grandes recursos.
Desprezados durante anos, os DJs ingleses de garage eram relegados aos clubes que funcionam aos domingos. As grandes noites de sábado, consagradas ao house ou ao tecno, não poderiam nunca correr o risco de chamá-los.
Mas o garage inglês forjou sua identidade. Primeiro nos afters, como os do Elephant Castle, um pequeno bar que funcionava das 9h às 14h, e depois na noite do Twice As Nice, que, após passar para os domingos no The Colosseum Club, se tornou "a melhor festa de Londres" -segundo a "Muzik".
No Twice As Nice, mas também no Pure Silk, nas noites do Camden Palace e do Bar Rumba, o clima não tem nada a ver com a triste realidade dos clubes ingleses.
Neles, a música só serve para ritmar o consumo de ecstasy e de outros estimulantes. Como ilustração, a "Musik" relata que clubbers chegaram a ser surpreendidos injetando vodca e uísque nas veias para "ver o que acontece".
O ambiente nas noites garage é diferenciado: baseado e Moet & Chandon. Impecavelmente vestidos, jovens dão à música quase a mesma atenção que à dança.
Foram certamente as rádios piratas londrinas, como Deja Vue, Freek FM ou London Underground, as primeiras a perceber os novos ventos. Em breve, serão retransmitidas por uma estação oficial, como a Kiss FM, em que Matt Lamond tem seu show semanal.
Mas a maior parte das compilações que vão desembarcar em breve nas prateleiras francesas deixam a desejar.
Para cada um "Underground Frequencies", mixado por Tuff & Jam (Karl Brown e Matt Lamont), seleção do melhor da cena, ou seja, títulos que souberam na reinterpretação guardar a alma do garage, quantos "Speed Garage Volume X ou Y" ineptos?
Para alguns produtores, trata-se de fazer dinheiro fácil, colando uma linha de baixos recopiada até o infinito e alguns samplers de voz insuportáveis.
Todo o desafio está agora em saber se o ritmo, algum dia, lançará um álbum tão importante como "Timeless", de Goldie, que deu letras de nobreza à jungle.
Por enquanto, o speed garage continua apenas como uma tendência a mais.

Tradução Luiz Antonio Del Tedesco.

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