São Paulo, sexta-feira, 12 de dezembro de 1997
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A cidade dos azulejos

JOSÉ SARNEY

O grande desejo de um parlamentar é conseguir defender sua causa. Grande ou pequena, o essencial é vê-la vitoriosa. O maior de todos, Nabuco, com a causa da Abolição, a única que uniu o país na grande paixão da liberdade dos escravos. O Visconde do Rio Branco sobre a Lei do Ventre Livre. Ferreira Viana, um dos maiores oradores do Parlamento, a dizer: "se fosse jovem morreria por essa idéia". Rui, na defesa da lei; Afonso Arinos, esse gigante da inteligência brasileira, contra a discriminação racial; Nelson Carneiro sobre os direitos da família; Carlos Lacerda contra os vícios da corrupção; Calmon com a educação, e tantos e tantos outros.
Eu, hoje, sou o mais antigo parlamentar brasileiro. O único remanescente da Legislatura de 1955. Minha causa parlamentar tem sido a cultura. Há 30 anos apresentei o primeiro projeto de lei de incentivo à cultura. Tenho a certeza de que, se o Brasil investisse US$ 10 bilhões, em dez anos em cultura (leia-se aí também um ramo da educação), seria outro país.
O Brasil, como qualquer país, não pode ser potência econômica, política, militar ou seja lá o que for, se não for potência cultural. O terceiro produto de exportação dos Estados Unidos é cultura. Daí, não entender que no "pacote" se retire incentivos à cultura. Esse é um indicador de burrice dos redatores de tal medida.
Estou em Nápoles. Feliz, como apaixonado por minha terra, o Maranhão, onde a cultura é valorizada. Na cidade não se erguem estátuas a soldados e heróis. Só a poetas e escritores.
Assisti a Unesco, em sua Assembléia Geral, no Cartel Nuovo, conhecido como Maschio Angioino, que data do século 13, na Sala del Baraoni, na grandeza dos seus séculos, proclamar São Luís do Maranhão patrimônio da humanidade, o maior conjunto de arquitetura colonial nos trópicos, casario, fontes, edifícios, ruas e história. É um patrimônio do Brasil. Durante 30 anos, a Unesco, pelos seus técnicos, estudaram todos os detalhes da cidade.
Abro o "Figaro" de Paris, a primeira página é ocupada pelo anúncio de que "Carcassonne", entre 552 cidades em 112 países, foi considerada patrimônio da humanidade. A França rejubila-se.
Só o Brasil não trata como deveria tratar o fato de que dentre essas 552 cidades, só cinco (!) foram declaradas pela Unesco um marco importante do homem na face da Terra. Uma delas, no Brasil, São Luís do Maranhão, fundada por franceses, ocupada por holandeses e feita portuguesa com pedras de cantaria vindas de Portugal, como lastro das caravelas.
A cultura, para mim, está acima de todas as coisas. Ela aproxima o homem de Deus. Fiquei emocionado. Ali estava a delegação do Maranhão, Estado da cultura, desde sua governadora Roseana Sarney, que tanto lutou por esse reconhecimento; o prefeito de São Luís; este pobre marquês e todos que choraram por esse fato.
Gilles Lapouge escreveu no seu livro "Equinoxial" que em nenhum lugar do mundo conseguiu ver a alma da cidade como lá: "São Luís é a mais bela cidade do mundo", diz ele.
E Simão Estácio da Silveira, navegador português do século 17, afirmou: "Das terras que Portugal conquistou, o melhor é o Brasil, mas o Maranhão é o Brasil melhor".
Viva São Luís!

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