São Paulo, domingo, 14 de dezembro de 1997
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Pacote deve quebrar a recuperação de lucros

Rentabilidade tende a cair, como ocorreu em 95

GABRIEL J. DE CARVALHO
DA REDAÇÃO

Os efeitos recessivos do pacote anticrash global deverá quebrar uma tendência de recuperação dos lucros das empresas brasileiras.
A rentabilidade média de 219 companhias com ações em Bolsa alcançou 6,4% de outubro de 96 a setembro de 97, contra 4,2% no período 94/96, de acordo com levantamento da Economática.
A mesma comparação mostra que, entre 25 setores, a lucratividade cresceu bastante em 13 e ficou estável em 5. Piorou em 7.
Analistas atribuem esse comportamento a vários fatores: queda da inflação e dos juros, alguma recuperação da taxa de câmbio (dando fôlego às empresas exportadoras) e recomposição tarifária das estatais de energia e de telecomunicações, que têm peso nas Bolsas.
Poderá acontecer, em 98, comportamento semelhante ao de 95, quando a rentabilidade média caiu de 5,1% para 2,5%.
Naquele ano o governo enfrentou os efeitos da crise mexicana com quatro medidas básicas: elevou a taxa de câmbio em 6%, criou o sistema de bandas, aumentou os juros (de 3,2% para 4,4% ao mês) e restringiu o crédito.
Agora, na crise asiática, as medidas só não envolveram um ajuste mais forte no câmbio. Os juros praticamente dobraram (de 1,58% para 3% ao mês) e o crédito refluiu por falta de demanda.
Marco Antonio de Almeida Panza, analista de investimentos de uma grande fundação, diz que o baixo crescimento econômico esperado para 98 fatalmente vai afetar os resultados das empresas.
A melhora crescente da lucratividade no Real teve muito a ver com o nível de atividade, diz ele.
A partir do pacote fiscal e da alta dos juros, a retração começa no comércio, vai para indústrias de bens duráveis e daí para bens de capital e matérias-primas, atingindo toda a economia. A recuperação é semelhante, comenta Panza.
Com a forte queda das vendas de bens duráveis, como carros e geladeiras, o consumidor passa a gastar mais com alimentos, por exemplo. Mesmo esse setor, entretanto, será afetado, entende Panza. "Sofre menos, mas sofre", afirma.
Heitor Hortêncio Jr., diretor da corretora Síntese, concorda que os efeitos da recessão tendem a ser generalizados. Só observa que o estrago depende do tamanho da recessão. Se não for tão intensa e o desemprego não se agravar tanto, poderá haver um deslocamento de consumo da classe média baixa para bens não-duráveis, como vestuário e alimentos, aliviando as consequências do pacote.
Uma recessão forte também pode não se confirmar pelo fato de 98 ser ano eleitoral. Obras de saneamento e de infra-estrutura, privatização de celular e do setor elétrico, entre outros fatores, tendem a puxar o nível de atividade.
Os lucros dos bancos, para ele, vão sentir o impacto negativo do salto dos juros e da inadimplência.
André Petersen, diretor do Banco Prosper, destaca que os resultados das empresas no Brasil ainda são muito afetados por fatores estruturais, como juro alto e "custo Brasil" (lei trabalhista rígida, deficiência de transportes etc.), além da recente abertura comercial.
Isso pode explicar o baixo desempenho de empresas brasileiras na comparação com argentinas, peruanas, chilenas e mexicanas, conforme pesquisa de Fernando Exel, presidente da Economática.
Apesar das peculiaridades das regras contábeis de cada país, ele constatou que a lucratividade média das empresas de energia elétrica, por exemplo, chega a 13% no Chile, contra 3% no Brasil.
Essa discrepância, observa Petersen, deve estar relacionada à privatização, que veio antes nos outros países da América Latina.

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