São Paulo, terça-feira, 16 de dezembro de 1997
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O roubo da liberdade

CLÓVIS ROSSI

São Paulo - O senador José Serra (PSDB-SP), em sua coluna de ontem nesta Folha, apresentou idéias que, supostamente, amenizariam a roleta russa em que se transformou a posse de um cartão eletrônico de banco.
Serra sugere limitações ao horário de funcionamento dos caixas eletrônicos e aos locais em que podem ser instalados.
Nada contra as sugestões. Podem até servir, de fato, para uma emergência como a atual. Mas são, ao mesmo tempo, a confissão, de parte de um destacado integrante do poder público, da incapacidade deste de prover segurança para locais igualmente públicos.
Em qualquer circunstância, tal confissão de impotência já seria grave. Mas, no caso, fica insuportável porque segurança pública é um dos pouquíssimos territórios que ninguém, até agora, se animou a propor que seja privatizado.
O Estado já saiu das atividades produtivas (siderurgia, minérios etc). Está saindo, no Brasil ou em outros países, de um punhado de serviços que, até muito recentemente, ninguém imaginava ver em mãos particulares (telecomunicações, metrô, coleta de lixo e assim por diante).
Educação e saúde já são, faz muito tempo, parcialmente privatizadas, ainda que o grosso do atendimento caiba ao setor público.
Se esse é incapaz de prover segurança, chamem, então, os anarquistas, porque o Estado não serve para coisa alguma, como eles sempre acharam.
Na Europa, o uso dos caixas eletrônicos é mais acentuado e não vi ninguém nem sequer olhar para o lado, de dia ou de noite, para ver se havia ou não perigo.
Aqui, o caso dos caixas eletrônicos prova que algo mais que dinheiro está sendo furtado da cidadania. O Estado, não por ação, mas por omissão e/ou monumental incompetência, está roubando a liberdade desde a de ir-e-vir até a de praticar gestos comezinhos do cotidiano.

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