São Paulo, sábado, 20 de dezembro de 1997
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BB escreve suas memórias com beicinho

CARLOS ADRIANO
ESPECIAL PARA A FOLHA

E Vadim criou a mulher nua na tela, lançando, em 1956, Brigitte Bardot como produto excitante da indústria da liberação sexual. E Godard autopsiou o mito de consumo numa obra-prima sobre o vazio de mitos e odisséias no mundo moderno: "O Desprezo" (63).
Esse filme era desprezado por Bardot, como se lê em "Iniciais BB", memórias da atriz (e manequim-sigla) agora lançado no país. Embora analfabeta mental, BB escreve com certa graça, valendo-se de ironias e trocadilhos. Em cada linha, interjeição e reticências o leitor pode vê-la fazendo o célebre beicinho.
Comenta o Brasil (o estrago em Búzios, o horror pela macumba, Jorge Ben tocando violão para sua alegria encharcada de cachaça) e as paixões (como Serge Gainsbourg, que compôs para a musa a canção que deu título ao livro e "Je T'Aime Moi Non Plus", gemidos trancados em cofre para evitar escândalos).
Já que se dispôs a escrever um catatau, BB, 63, podia contar mais sobre os 48 filmes que fez de 1952 a 73 e os diretores com quem filmou (Guitry, Godard, Vadim, Malle, Deville). Mas ela nem diz o que pensa de seu sexy-papel e apelo na proa da moda sensual no cinema.
Às vezes BB fala tantas bobagens e besteiras que a gente gostaria que ela fosse sufocada pelas peles de bebê foca que tanto se empenha em proteger.
A atriz, simpatizante da extrema direita, demonstra um fastio pela profissão, preferindo viver descalça, paladina de bichos, num "ecotolismo" conservador.
É dose aguentar quando BB, decidida a dar seu carisma à causa ("cruzada") em prol dos animais, compara um canil pestilento a um campo de concentração.
Terminada em 95, a narrativa de sua vida acaba nos anos 70, quando largou o cinema, entre pombas e cabras, coletando restos de comida para cães.
Bom e bacana: fotos e -algo básico, mas raro nas biografias de atrizes- filmografia. Porque, mesmo tentando fixar a vida na página, o que sobra é a imagem impressa na tela, e o papel vivido na realidade nem sempre é menos pior do que o de um filme.

Livro: Iniciais BB - Memórias
Autora: Brigitte Bardot
Lançamento: Scipione Cultural
Quanto: R$ 48 (602 págs.)

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